Para Very Important People: Balenciaga

Parece que o fim da era Demna Gvasalia na Vetements se deu porque ele queria caprichar ainda mais na Balenciaga, seu atual (e agora único) emprego. No spring 2020 em Paris, o desfile da maison francesa mexe no vespeiro, a começar pelos primeiros looks com alfaiataria escura e um certo tom de… como dizer… assalariado? “Nasci branco e com a vida ganha"? O estilista deixa claro seu tema político quando ambienta a sala de desfile como uma assembleia.

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Esse é o primeiro look

Com direito a crachá (CLT é um luxo; a Balenciaga já tinha incluído esse crachá no seu styling antes), logo que lembra a Mastercard, a palavra VIP impressa no crachá e uma modelagem mais solta. O sapato tem bico quadradão - aliás, o look em si é quadradão, né?

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Olha o logo de pertinho

Certas coisas o dinheiro não compra. O meu dinheiro certamente não compra Balenciaga, garanto!

E na sequência derivada desse look, chama a atenção a maioria de cabelos grisalhos e de pele branca - exceto um modelo, negro e que parece mais jovem, notadamente com a versão de manga curta do paletó. O poder está nas mãos de quem? De uma maioria velha e branca, vamos falar em português bem claro. E nem estou falando só de idade: de cabeça também.

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Born this way

Algumas modelos ganham esse rosto anguloso tipo Lady Gaga. Esse é um dos vestidos com cara de alfaiataria, de "roupa de escritório” só que muito chique. Também tem um clima de uniforme, de formalidade: linhas retas e amplas, ombreiras

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Pendura a minha conta - na orelha!

O cartão de crédito não é mais uma navalha e sim um brinco

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Oversize demais

Um ternão - a calça precisa ficar cintura alta para não arrastar!

Também pintam estampas interessantes: uma traz logos inspirados em veículos jornalísticos; outras valorizam elementos da própria Balenciaga, como acessórios e frascos do perfume Le Dix.

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Tô plissada

Várias peças de alfaiataria chegam com esses amassados horizontais, quase uns plissadões. A calça jeans também é maxibaggy; e repara no mullet (!) e no brinco de navalha (!!), só porque eu fiz a brincadeira com a música Brasil e o cartão de crédito!

Conjuntinhos: de couro, de jeans, de jogging. Mas combinando em cima e embaixo. Usar couro da cabeça aos pés em 2020? Não sei se é couro fake.

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Olha quem veio para a festa

Tem outras versões de cor. Mais uma vez a ironia bomba quando, em uma coleção tão adulta e séria, Gvasalia encaixa uma Hello Kitty gigante!

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Novo Matrix

O verde claro da vez (neo mint, segundo a Pantone) e os brincos de golfinho (boto rosa??)

Blusa mamãe-eu-sou-fortinho (só de falar isso já me dá arrepio). Odiei. Mas enfim, a Balenciaga não está aqui para me agradar. Sexo, permitido só para maiores, e se não aguenta pede H2O. Com esses símbolos de "só alguns podem” (o VIP do primeiro look, o +18 desse), Gvasalia vai falando sobre jogos de privilégio e poder em forma de imagens.

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E aí o ombro cresce mais…

Look de pois e olha a meiaaaa

E aí, meu bem, olha o que acontece com o ombroooo!

Aí teve esse look que eu adorei, de oncinha. Repara que a meia na verdade não cobre o tornozelo:

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A camisa também amassou

E a gargantilha de corrente de bicicleta? Fiquei me perguntando o que é esse negocinho com espinhos de plástico - será que é um massageador? kkkk

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Sereia gótica

Brinco de concha neon e veludo molhado coladinho, bem mudérna!

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Musa!!!

Nadja Auermann, modelo incrível, figurinha fácil na passarela da Mugler na virada dos anos 1980 para os 1990. Belíssima!

E o desfile termina com uma sequência de vestidões absurdinha - se você tira a crinolina, Gvasalia garante que super dá para usar no dia-a-dia:

O novo power suit? Parece retrô. E parece atual. Acima de tudo, me parece mais relevante que a maioria das coisas apresentadas em Paris nessa temporada.

O que significa o fim da era Demna Gvasalia na Vetements?

Spoiler: a princípio, na minha opinião, nada.
Mas você, caro leitor, sabe o que é Vetements para começo de conversa?

Há 5 anos a moda tomava um susto: era a Vetements de dois irmãos da Geórgia (o país do leste europeu, não o estado dos EUA) que virava o hype da vez. Demna Gvasalia era o estilista e Guram Gvasalia segue atendendo como CEO da marca que usa a ironia e o streetwear jovem como principal apelo no seu caldeirão, pelo menos até agora. E é importante citar também a Lotta Volkova, stylist importante no desenvolvimento da estética deles durante esse tempo.

Nesse meio tempo Demna foi chamado para substituir Alexander Wang na Balenciaga para espanto de todos - e, espantosamente, se deu bem, injetando essa sua verve irônica na marca que já tinha história e técnica de modelagem na sua origem, virou o maior hype em seu renascimento pelas mãos de Nicolas Ghesquière na virada dos anos 1990 para 2000 adentro (ai, Gabi, só quem viveu sabe…) e na versão de Wang ficou muito autorreverente (a melhor coleção de Wang foi a última, um boudoir chic que deixou a gente com um gosto de quero mais na boca - por que só ficou bom no fim?). Demna fez coisas como a bota-meia com estampa de notas de dinheiro, a sacola da Ikea (lembra??), o crocs plataforma, o brinco-alfinete de segurança…

Agora Demna deve seguir na Balenciaga mas anunciou sua saída da Vetements. A marca atualmente tem sua base em Zurique (?! que imposto menor é esse, minha gente? Será que Zurique é o futuro?) e Guram anunciou em comunicado oficial reproduzido pelo WWD que eles sempre foram “um coletivo de mentes criativas. Vamos continuar a ampliar os limites para ainda mais longe, respeitando os códigos e os valores autênticos da marca, e seguir apoiando criatividade honesta e talento genuíno".

Mas quais são os códigos & valores da Vetements?
Ela sempre assumiu um papel provocativo nesses cinco anos, quase sádico: fez o pessoal da moda ir em apresentações em lugares como McDonald's ou no darkroom de um clube de sexo gay; fez o pessoal da moda ter que comentar (e usar!) looks com logos da transportadora DHL ou do videogame Playstation. Exagerou o oversize, a ombreira; adiantou a volta da estética anos 1990. Não é que a Vetements (e consequentemente Demna) vê a poesia do cotidiano e a romantiza, nem que ele transforma o que seria de "mal gosto” em desejável como é o caso de Miuccia Prada. Ele simplesmente recontextualiza o comum; dá status fashion ao que não tinha esse status. É um jogo de copy-paste e ganha quem fizer o copy-paste mais absurdo e impensável.
É a cara da ironia hipster dos anos 2000.
Mas será que em apenas 5 anos essa ironia vetemânica que abalou Paris… cansou Paris?
Meu palpite é que ainda não.

Primeiro que Demna deve seguir com esse caminho na Balenciaga, onde ele possui o back up de um ateliê minucioso que dá as suas loucurinhas o acabamento exato para elas se transformarem em loucurinhas de luxo, carérrimas.
Segundo que a Gucci também faz quase isso com mais poesia e romantismo (e sucesso); e a Moschino também faz quase isso com menos finesse (e mais referências pop e espetacularização, portanto com resultado mais popular).
Porém, e a Vetements, vai continuar nessa sem Gvasalia?
É uma situação complicada: se não tiver um sucessor para dar cara a tapa (e à marca), assinando como coletivo, a Vetements pode parecer mais diluída, uma versão menor da era Demna. Se tiver um sucessor e ele seguir na mesma ironia, pode parecer reducionismo. E existe uma forma diferente de ironia? Ou a pessoa que assumir esse cargo pode ter um trabalho que ironiza a ironia anterior - coisa que seria bem hipster.
Ou a Vetements vai deixar de ser irônica. O que seria bem irônico.

It's like raaaaaaaaaainnnnn

It's like raaaaaaaaaainnnnn

Por que não fiz nenhum texto sobre os desfiles internacionais até agora?

Achei a temporada internacional de moda masculina ruim?
Não necessariamente.
O desfile da Miu Miu de resort 2020 foi ruim?
Não tampouco.
Mas me empolgou? Hum…

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Miu Miu resort 2020

Subvertendo símbolos do conservadorismo no Hippodrome d’Auteuil em Paris

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Celine spring 2020

Foco no ícone David Bowie em O Homem que Caiu na Terra, filme de 1976 de Nicolas Roeg, e uma pegada anos 1970 londrina no geral

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Kenzo spring 2020

O último desfile de Carol Lim e Humberto Leon para a marca se inspira nas mergulhadoras japonesas ama. O documentário Ama-san, que passou nos cinemas daqui no começo do ano, falava delas!

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Thom Browne spring 2020

Uma mistura do esporte com referências ao século 18 e muitas bolas

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Dior Homme spring 2020

Esse trabalho de maquete têxtil do Kim Jones é simplesmente do caralho de tão maravilhoso

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Rick Owens spring 2020

Glam, futurismo à anos 1990 - um chic exótico. Essa fase do Owens me dá mixed feelings: usaria muito mais, acho as roupas incríveis, porém fico mais entediado sem as experimentações conceituais dele…

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Vetements spring 2020

Gótico anos 1990 no McDonald's da Champs-Élysées… Oh, OK

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Comme des Garçons spring 2020

Gênero fluido com joias em trompe-l’oeil, alfaiataria, babado e até vestido

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Louis Vuitton spring 2020

Para quem realmente gosta do monograma… O famoso utilitarismo que seria mais útil se fosse mais prático. No geral, um desfile cheio de flores, pipas e tons pastel

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Valentino spring 2020

Estampona, chapéu pescador, um ar surfistinha chic que eu acho legal & bonito e ao mesmo tempo muito estudadinho para o meu gosto

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Lanvin spring 2020

Estou adorando o trabalho do Bruno Sialelli na Lanvin. A maison de moda mais antiga em atividade andava patinando nas últimas diretorias criativas. Aqui o tema náutico acontece em águas doces!

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Craig Green spring 2020

Sabe aquelas bandeirinhas mexicanas?

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Versace spring 2020

Eu já disse anos 1990 nesse post? Prodigy na veia

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Saint Laurent spring 2020

Um dos meus preferidos dessa leva, rolou em Malibu. Anthony Vaccarello imaginou a Marrakesh de Yves Saint Laurent atualizada para a Los Angeles de hoje - mas eu duvido que as pessoas vão se vestir assim em Los Angeles…

Eu poderia continuar ad infinitum mas acho que com isso já vou conseguir meu ponto.
Já existe muita roupa no mundo. A maioria desses desfiles - mas a maioria mesmo - me parece mais um exercício de styling com roupa que poderia ser encontrada em brechó do que algo de fato novo.
Se é assim: por que a gente não se dedica mais ao exercício de styling com a roupa que a gente já tem ou que a gente encontra em brechó no lugar de comprar roupa nova?
O mercado de luxo e o varejo de moda em geral, ao meu ver, tem um cheiro forte de antigo. Não tenho mais vontade de falar dele no geral. Não me empolga. Penso na moda como um reflexo de referências da sociedade; não me parece que os desfiles têm feito isso de maneira contundente, como já fizeram.

Espero me empolgar com os desfiles da Casa de Criadores, que começa na próxima quarta-feira? Sim. Odeio gastar Uber com nada - coisa que tem acontecido bastante. #indiretas

E você, gostou da temporada? Do que você mais gostou? Também acha que a Vetements é uma bobagem?
Ops, falei.