Live, work, POSE!

A Netflix anunciou recentemente que Pose, a série, está chegando sim no seu catálogo BR! E a gente está como?

You go, Elektra!

You go, Elektra!

Isso porque Pose, que passou originalmente no canal FX americano, é uma das séries mais empolgantes que vi ultimamente. Ela já merece reconhecimento por ser a primeira a ter um elenco majoritariamente trans - e não é uma atriz ou um ator cis interpretando mulheres trans, e sim atrizes trans!

Além disso, Janet Mock, mulher trans, é diretora e roteirista de 3 episódios da primeira temporada. Janet é ativista, fodérrima, vale a pena acompanhar.

Além de tudo isso, Pose traz uma versão ficcional de uma parte importante da história queer. Explico: a trama se passa na NY do fim dos anos 1980, focando na subcultura dos bailes de voguing. Sabe a música Vogue da Madonna? Então, ela chupou dessa cena - e dá-lhe polêmica, pois muita gente a acusa de ter se apropriado disso sem dar nada de volta para essa galera, que era (e é) um pessoal marginalizado, queers latinos e afro-americanos.
Para referência, assista Paris is Burning (que tem na Netflix e é um doc justamente sobre essa cena de voguing) e Strike a Pose (que também tem na Netflix e traz os bailarinos da turnê Blond Ambition e do filme Na Cama com Madonna - o que aconteceu com eles depois desses dois momentos históricos do pop? Alguns saíram justamente dos bailes).
Também tenho um livro que é muito legal e vale a pena para quem se interessa: Voguing and the House Ballroom Scene of New York, 1989-92, cheio de fotos e entrevistas com figuras centrais.

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Puta livro!

Daqueles que você não resiste e depois não se arrepende de ter comprado!

A cena do voguing é superimportante porque funciona como ferramenta empoderadora para essa turma que se vê excluída da sociedade: ali, eles podem performar o que quiserem. A mulher de negócios. O macho alfa. O glamour das passarelas. À americana, trata-se de uma competição; mas também parece uma válvula de escape frente aos problemas reais, e um treino para encarar e lutar contra o desrespeito e o abuso de cabeça erguida.
Outro fator chave que também é abordado por Pose: também é nessa época que cresce a epidemia da Aids.

Madonna falou de voguing na Blond Ambition mas chegaria um pouco atrasada no segundo assunto, só na turnê seguinte, Girlie Show, baseada no álbum Erotica e no embalo do livro Sex. Era a música In this Life, que dizem que é sobre dois amigos dela, Martin Burgoyne e Christopher Flynn, ambos vítimas.
Mas precisamos ser justos - Madonna já se envolvia com a causa sim, antes do lançamento de Erotica em 1992. O vídeo abaixo é de 1989:

Ela também tinha outros amigos que morreram vítimas da Aids, como o artista Keith Haring em 1990, antes da música ser lançada.

Enough of Madonna, pois esse post é sobre Pose, certo?

Acho que já deu para perceber quem é a minha preferida, né?

Acho que já deu para perceber quem é a minha preferida, né?

Essa cena do gif acima é do primeiro episódio da primeira temporada, no qual a House of Abundance invade a exposição de moda do Met (sim, o Metropolitan Museum, aquele do baile do camp, mas na época que o Met Gala não virava assunto do Twitter e do Story do Instagram porque não existiam essas duas coisas). Eles invadem a exposição para roubar looks (!) para desfilar no baile de voguing (!!) e não se abalam quando vão presos (!!!).

E você achando que fazia sacrifícios pela moda, né?

A verdade é que, além desses momentinhos maravilhosos, Pose é muito tocante com essa relação de novas famílias e laços se formando entre os que foram rejeitados pelos seus - chorei em praticamente todos episódios. Claro que conta muito o fato de me identificar com o preconceito contra LGBTQ, mas a história é bem contada mesmo.

Em junho, a série que é uma criação de Ryan Murphy (o mesmo de American Horror Story e Glee) estreia sua segunda temporada lá fora. QUEREMOS.

Estou no aguardo!

Estou no aguardo!

Ah, e sabe quem está no elenco da série e homenageou uma pessoa chave da cena voguing no último Oscar? Sim, eu disse OSCAR.

Billy Porter, você é tudo, obrigado por existir.

Se você criasse uma house para um baile de voguing, como ela chamaria?
A minha seria a HOUSE OF CLODOVIL.
Agora olha para a lente da verdade e me diz…
POSE!

Joy is a choice! Já estou chorando de novo.

London, London: para quem vai pela primeira vez

Sim, caro leitor: vou para Londres mais uma vez daqui a menos de um mês.

O incauto deve pensar: pôxa, tanto lugar para ir no mundo, por que o Jorge vai tanto para Londres?
Primeiro porque é melhor que Paris (brincadeira; mas é verdade).
Mas o motivo acho que vem da minha educação, acredita?

Papai sempre fez questão de investir muito na minha educação e na das minhas irmãs - tanto que fiz duas faculdades particulares. E desde pequeno ele me matriculou na Cultura Inglesa: a gente precisava estudar inglês, isso seria um diferencial no mercado de trabalho. Ele nunca tirou isso da cabeça. Realmente foi e é um diferencial, meu inglês é bem bom por causa de todos esses anos em que fiz aula duas vezes por semana na Cultura - que os iniciados chamavam de Tortura Chinesa. No fundo era legal, só era chato ter que ir em mais uma escola além da escola normal, né? E um lado da Cultura Inglesa que é bacana está no nome: lá você não só aprende a língua, mas todo o material didático está cheio de referências ao Reino Unido, de cool britannia a swinging London passando por lugares turísticos, English breakfast e obviamente o sotaque. O inglês que você aprende na Cultura é o britânico, e tive professores nativos da Inglaterra.
Resultado: virei uma criança e um adolescente fissurado em tudo que era inglês. Tava nem aí para NY, EUA e Disney: queria saber de Beatles, de Rolling Stones, de Oasis, de Blur e de Spice Girls. Queria saber da Ministry of Sound, de Prodigy e Chemical Brothers, do David Bowie, do George Michael (“será que ele é gay, mesmo?!”), da The Face (até hoje a minha revista preferida é uma revista inglesa, a Mojo), da família real britânica especialmente Lady Di, de Trainspotting. Nos anos 1990 o moderno estava em Londres, quem era moderno queria estar em Londres - durou até os anos 2000, quando Madonna casou com Guy Ritchie e aí estragou o rolê. Risos! Tô brincando, não me matem, queridos fãs de Madge.
E por isso acabei fazendo um pequeno intercâmbio de um mês para Londres com a minha amiga Massami Akutsu em 1997, nós dois com 16 aninhos, no fervo dos hormônios, querendo descobrir tudo. Tudo o que você está imaginando que a gente pode ter feito: sim, fizemos. Inclusive ir na Ministry of Sound e de fato conseguir entrar nela (usei uma carteirinha de albergue de uma carioca maior de idade que se chamava Daniela!). Foi em Londres que beijei um homem pela primeira vez - e ele era londrino.

Lady Diana Spencer morreu em Paris mais ou menos um mês depois da gente voltar desse intercâmbio. Em 1998, Geri Halliwell anunciava sua saída das Spice. E entre 1999 e 2000, eu trabalhei na assessoria de imprensa do canal Multishow e assisti pela primeira vez Absolutely Fabulous, a série inglesa mais perfeita da história das séries inglesas (com The Office quase lá).

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Ícone

Sou meio fissurado na história dela até hoje. E você?

Essa introdução que virou um textão é para dizer que Londres sempre rondou e provavelmente sempre vai rondar a minha vida - e a coisa ficou ainda mais exagerada quando criei um monstro levando o meu marido para lá e apresentando a cidade para ele. Foi paixão avassaladora à primeira vista - depois disso ele vai para lá sempre, ainda mais vezes do que eu! É por isso que esse post, com dicas para quem vai para a cidade pela primeira vez, tem a assessoria dele - thank you, baby! ;)
Sem mais delongas: vamos a elas?

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Pegar busão é bom

Se você tem mais tempo, o ônibus é muito mais legal do que o metrô. Ele é mais barato, vai demorar mais porém você vai observando a cidade, e tem todo o charme dos dois andares.

Menção honrosa à nossa amiga Yéssica Klein que nos apresentou a linha 23, que vai para quase todos os lugares que você precisa ir ou pelo menos bem perto desses lugares!

E só pegue o black cab, os famosos táxis pretos londrinos, se você for milionário.

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Zona 2 at least

Londres é dividida em zonas: no centro fica a 1, ao redor do centro fica a 2, e assim por diante. Na minha humilde opinião, a zona 3 já fica bem longe das principais atrações turísticas e você vai demorar mais e pagar mais caro no transporte público.

Existem bairros especialmente estratégicos e com bastante opções de acomodação: Earl’s Court e Paddington são os que a gente usa bastante, com preferência pro primeiro porque ele tem boas linhas de metrô (a Piccadilly Line, por exemplo, vai direto pro meio do fervo: Piccadilly Circus, Leicester Square, Covent Garden; e é por ela que você consegue ir para a King’s Cross St Pancras para pegar trem!). Dá para ir em várias lugares em uma caminhada. E os hotéis são bem legais na questão custo x benefício!

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O seu melhor amigo

Pret a Manger é um dos lugares mais legais para tomar café e comer alguma coisinha no meio do seu roteiro: o custo x benefício é bom (Londres é uma cidade cara mesmo, então essa dica é preciosa), as coisas são bem gostosas.

A culinária inglesa não é exatamente deliciosa. Até que curto (pois excêntrico) mas com moderação e só fish & chips (peixe empanado com batata frita), algumas tortas (mas apenas algumas mesmo, a chance de ser sem graça ou ter um gosto bem exótico é grande) e pronto.

Então nossa dica para Londres para comer barato é supermercado - lá eles têm várias coisinhas já prontas e inofensivas, tipo salada, pão recheado, macarrão etc. E também vale dar uma olhada nos restaurantes de estrangeiros: chinês, árabe, italiano, vietnamita… Provavelmente vai ser mais barato e mais gostoso.

Ah, e tem redes de restaurante que a gente adora: Eat, Wagamama (que é um pouco mais caro mas muito gostoso), Wasabi e o Itsu. Outro segredo: geralmente no Itsu as coisas que sobram ficam 50% mais baratas um pouco antes do restaurante fechar, tipo meia hora antes. Ah, e sabia que às vezes isso também acontece nos mercadinhos da Liberdade em São Paulo?

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Ainda existe um indie dentro de mim

Então a gente continua frequentando a Rough Trade!

Uma das lojas de música mais incríveis do mundo, a Rough Trade é parada obrigatória. Você só ouve Spotify? Tudo bem: também é um bom lugar para você descobrir sons que não conhecia e depois buscá-los no seu aplicativo. Como tenho vitrola, às vezes acabo saindo com um disquinho (ou dois, ou quatro…). Mas confesso que o que amo mesmo é a seleção de livros deles - sempre tem algo que me interessa. Aliás, fica a dica também para a seção de livros da Harrods - sim, é carérrima; sim, você provavelmente não vai levar nenhuma roupa; mas sim, talvez você leve um livro!

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Mais compras?

Não esquece de passar na Tiger!

Existem todas as lojas manjadas para quem viaja para o exterior - as minhas preferidas são Uniqlo e Urban Outfitters, o Pedro não resiste à Primark, sempre passamos na H&M. Às vezes a Pull & Bear está bem legal, e eu tenho ficado muito na onda da Benetton depois que o Jean-Charles de Castelbajac assumiu a direção criativa. Eu a-do-ro a Fiorucci, então sempre dou uma passadinha; e a Liberty, que simpatizo, mas obviamente nunca compro nada por motivos de conta bancária saudável. Da última vez que fomos, também curtimos a Goop, loja da Gwyneth Paltrow, principalmente na parte de beleza. Cara porém agradável. E o Pedro, como é muito fã da Vivienne Westwood, sempre quer ir em pelo menos uma loja dela - a de Chelsea, a World’s End, é tipo ponto turístico para o fashionista pois segue no mesmo endereço e imóvel que Vivienne abriu a sua mítica loja SEX com o então marido Malcolm McLaren e influenciou a estética do punk para sempre. Mas talvez a mais legal de todas seja a Flying Tiger, uma loja de miudezas de Copenhagen que traz um monte de coisa que a gente nunca soube que queria ter mas de repente é tudo na vida: um conjunto de copinhos rosa com um desenho fofo, uma máscara linda para usar no Carnaval, uma placa luminosa, um lápis todo brilhoso, cabo USB colorido. O Alexandre Herchcovitch já me disse que também ama! É tudo baratinho, então você acaba levando cerca de 500 itens, pagando um milhão de libras e se preocupando com o excesso de bagagem.
Pensando bem, talvez seja melhor você nem entrar nessa loja.

Ah, e tem outra loja, essa um pouquinho mais antiga…

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Uma loja mais velha que a sua avó

E a sua bisavó. Bom: é uma loja mais velha que a Revolução Industrial!!!

A Fortnum & Mason foi aberta em 1707 pelo mister Fortnum e mister Mason, e inicialmente vendia comida. Hoje ela é uma loja de departamento chique, mas segue no segmento alimentício: chocolates lindos, docinhos e, principalmente, chás. Ela ficou intimamente ligada à imagem da família real inglesa e tem entre os seus blends o Queen’s Blend Tea, criado em homenagem à rainha Elizabeth, a monarca com maior tempo de reinado em UK. Ui! Mesmo que você não vá comprar nada (mas duvido que você não saia com um pacotinho de chá para sua mãe), vale visitar. O preço não é barato, mas é pagável e você se sente adquirindo algo luxuoso.

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Não seja uma ostra

Vale a pena comprar o Oyster? Olha, eu acho que sim, pela praticidade. Mas fique atento às regras!

Tem uns pacotes para usar o cartão à vontade por um período e combinação de zonas, mas ele pode não ser válido para alguma área específica. A do aeroporto, por exemplo: quando você chegar em Heathrow, só coloque dinheiro no Oyster para ir até o hotel e ainda não compre pacote porque vai dar ruim, a região do aeroporto é a 6. O pacote é validado assim que você o compra - então é melhor comprá-lo quando você já estiver na zona do seu hotel!

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Vá ao museu, por favor

É de graça. É sério, vá.

Museu geralmente é carérrimo na Europa. Absurdo de caro. Esse é um dos motivos para amar Londres: acervos de museu incríveis e com entrada gratuita! Eles pedem contribuições espontâneas, e às vezes a gente até dá com gosto porque é muito legal. O meu parâmetro é não dar se eu vou para alguma exposição paga lá dentro; e geralmente acabo indo.

É difícil falar quais são meus museus preferidos na cidade: pode ser todos? Esse da foto é o Tate Modern, que amo. Tem o Victoria & Albert, o de História Natural, a National Gallery, o British Museum, o de Ciência… É tudo mara. Mesmo que você não goste tanto dos rolês de museu, acho que vale porque é de graça mesmo. E você devia gostar, quem sabe indo em um museu londrino você não acaba descobrindo que gosta?

E eu também queria falar das ROUBADAS. Tipo: já fui, não recomendo!

. Troca da guarda: é uma bobagem, mas todo mundo vai. Já fui mais de uma vez. Vale a pena? Não. Vou te julgar por você querer ir? Não mesmo. Você vai se arrepender? Vai sim. Tudo bem? Tudo bem. Mas se quiser pular, não fique com dor na consciência!

. Madame Tussauds: o museu de cera é feio, é caríssimo, é cafona. Não precisa, a menos que você queira dar risada e esteja, digamos, podendo ($$$).

. London Pass: olha, os museus são de graça. Se é a primeira vez que você vai para Londres, o acervo deles já vai ter muita coisa para ver. Talvez você queira ir para uma ou outra exposição paga, e mesmo assim a gente acha que não vale o preço de um London Pass. Faça o cálculo antes.

. Metrô no horário de pico: só vi coisa pior na linha vermelha em SP e no horário de pico em Tóquio. Faz uma horinha no Starbucks, vai por mim. Ou vá à pé, vai ser bem mais confortável por mais longe que seja.

. Região dos museus no sábado à tarde: evite. Aliás, sábado à tarde é hora boa para, sei lá, ir em um dos parques, ir para Camden Town, ir conhecer Hackney e Shoreditch - qualquer coisa que seja mais afastada dos grandes centros de compra ou de visita.

Você assistiu ao primeiro capítulo de Chernobyl?

A série da HBO estreou na semana passada e nessa, ao menos, a gente não precisa se preocupar com spoiler: sabemos bem como a história termina. Bom, pelo menos eu sei: pesquisei bastante porque, se você ainda não sabe: eu estive em Chernobil em janeiro desse ano.

A sala de controles da usina de Chernobil, mais especificamente do reator que explodiu, na série

A sala de controles da usina de Chernobil, mais especificamente do reator que explodiu, na série

O primeiro episódio é bem grande e bem tenso, já mostra logo a explosão do reator 4, os trabalhadores e os bombeiros sofrendo os efeitos da radiação, as primeiras mentiras que rolaram negando a extensão do acidente. Pesadíssimo, chocante - e sim, o reator que explodiu em 1986 é o número 4 pois existem o 1, 2 e 3. Eles continuam em atividade até hoje.

398 Likes, 26 Comments - Jorge Wakabara (@wakabara) on Instagram: "Esse atrás de mim é o reator número 4 que explodiu em Chernobil em 1986. Quer dizer: é uma..."

Sim, essa foto de cima foi tirada em janeiro e está no meu Insta. A estrutura montada ao redor do reator serve para conter a radiação que segue altíssima lá dentro, e deve continuar alta por séculos.

Quando eu contei que ia para Chernobil as pessoas ficaram doidas. É que na verdade eu começava aos poucos - primeiro dizia que ia para Ucrânia, aí perguntavam “mas por que a Ucrânia?” e eu contava o processo: a viagem estava marcada com a minha amiga Helô Dela Rosa para Londres e queríamos decidir algum lugar além da capital inglesa para ir. Aí ela disse: “Vamos para Kiev?!” Achei muito exótico porém gosto de coisas exóticas, ela disse “dá um Google Images, vê como é lindo!”

Se você der um Google Images vai ver que é lindo mesmo. Mas ela deixou para contar um pequeno detalhe só no final: o sonho e o plano verdadeiro dela era ir para Chernobil. Nesse vídeo abaixo a própria Helô fala mais sobre essa experiência:

Bom, aí era tarde, né, eu também fiquei com vontade de ir. Kiev é uma cidade bem bonita mesmo, com várias coisas interessantes para ver. Mas Chernobil e Pripyat são impressionantes, ruínas contemporâneas, símbolos da gravidade que o imprevisto pode tomar.

Não preciso dar muitas dicas porque se você for, você deve ir com uma agência especializada e eles mesmos vão ser os responsáveis por dar essas dicas. Mas enfim, não é um lugar que você pode sentar no chão, cheirar uma plantinha, tocar em algo que você encontrou - parece lógico mas alguns turistas que estavam no nosso grupo não entenderam tão bem… Também não é um lugar de turismo do jeito que a gente conhece. O local desperta reflexão, acho que pode até ser um gatilho dependendo da sensibilidade da pessoa.

Outro livro que recomendo (e que a Helô também leu) é Vozes de Tchernóbil: Crônica Do Futuro, da ganhadora do Nobel de 2015 Svetlana Alexijevich. Tristíssimo, com depoimentos de sobreviventes da tragédia, é um bom complemento para quem assistiu a esse capítulo de Chernobyl e se interessou. Abaixo, o trailer oficial:

Tracey Thorn é rainha demais!

Foi um tempinho sem conhecer Everything But the Girl. A dupla, formada por Tracey Thorn e Ben Watt, começou sua carreira em 1982, mas foi só quando eu tinha 15 anos, em 1996, que fui visitar minha irmã Ana Flavia que estava morando em Atlanta e ela tinha comprado o CD Amplified Heart com o megahit Missing (aquele que ganhou um remix bem bate-cabelo).

Foi mais uma das coisas de música que minha irmã me apresentou e amei - uma boa parte do meu gosto musical se construiu pelos discos dela. Tracey tinha uma das vozes mais lindas que eu já havia ouvido - e segue assim até hoje. Ela era muito cool, assim como seu marido Ben. Um pouco depois, em 1996, eles lançariam o eletrônico Walking Wounded - o ano em que fui para Londres pela primeira vez, então imagina como amei, né? No mesmo 1996, era lançado o Red Hot + Rio, álbum coletivo cuja renda ajudava na conscientização sobre a AIDS, nessa época ainda uma doença muito misteriosa - a lista de músicos incluía Marisa Monte com David Byrne, Crystal Waters cantando The Boy from Ipanema em versão house, Caetano Veloso com Cesária Évora e Ryuichi Sakamoto, Chico Science e Nação Zumbi em versão remix, Cazuza e Bebel Gilberto numa versão demo bem caseira e linda de Preciso dizer que te amo.

Eu me apaixonei perdidamente por esse disco, ouvia pencas, ele era tudo que mais amava. A segunda faixa era Corcovado com o Everything but the Girl, Tracey tentando imitar o sotaque de João Gilberto, batidas que críticos odiaram por tirar toda a bossa da bossa nova - mas era essa a nova bossa, era estranho e muito atraente para mim. Cantava junto imitando o sotaque da Tracey Thorn, meio ridículo, meio intrigante, meio charmoso, meio irresistível.

A verdade é que qualquer coisa que Tracey fizesse a partir daquele Amplified Heart eu provavelmente comeria de garfo e faca e lamberia os beiços. Como Protection, a música na qual ela escreveu letra e melodia com o Massive Attack.

O tempo passou e eu aprendi a amar toda a discografia do Everything but the Girl. E fissurei até na banda que Tracey teve antes, a obscura Marine Girls, que virou moda entre os indies porque tinha um fã bem famoso: Kurt Cobain.

Depois o Everything but the Girl acabou e Tracey se dedicou a uma carreira solo (que também adoro). Mas eu queria chegar em outro lado dela: o de escritora.

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Ela começou com uma biografia

Mas deu tão certo que virou colunista da revista New Statesman

De lá para cá, além do Bedsit Disco Queen, Tracey lançou mais dois livros. Esse post inteiro é mais para falar do segundo, Naked at the Albert Hall, no qual ela fala sobre o cantar e cantores.

Tracey escreve muito bem, tem aquele humorzinho ácido inglês e ao mesmo tempo se aprofunda nos assuntos de uma maneira que gosto muito, com pesquisa, citando diversas fontes - incluindo livros de ficção que possuem personagem cantores. As discussões que ela levanta são muito interessantes: por que a gente acha que a letra que o cantor canta sempre tem um caráter pessoal? Por que a gente sente um tipo de intimidade doida com cantores que geralmente não acontece com outros tipos de artista? Por que o fã pode ser um negócio maluco e obsessivo? Como é que o cantor encontra uma voz e um jeito de cantar e geralmente não consegue mudar depois, quando já tem uma carreira consolidada?

Explaining how you wrote a song, or what it’s about, it reminds me a bit of that Robert Frost quote, when he was asked to explain what a poem meant and he said, ‘What d’you want me to do? Say it again in worser English?’
— Tracey Thorn entrevistando Romy Madley Croft do The XX em "Naked at the Albert Hall"
Tracey é uma pessoa que pensa nas coisas que canta e que escreve - isso me atrai! Fonte da foto: Rolling Stones, o artigo que fala sobre o último álbum que a Tracey lançou, Record

Tracey é uma pessoa que pensa nas coisas que canta e que escreve - isso me atrai! Fonte da foto: Rolling Stones, o artigo que fala sobre o último álbum que a Tracey lançou, Record

Para terminar, ressalto os ótimos dois refrões de Dancefloor, música do último disco de Tracey.

Oh but where i’d like to be
is on a dancefloor with some drinks inside of me
Someone whispering it’s quarter after 3
There’s no where I’d rather be
(...)
Oh but where i’d like to be
is on a dancefloor with my friends all pissed at me
Someone singing and I realise it’s me
I realise it’s me
— Tracey Thorn em "Dancefloor"