Existem dois Genghis Khan. Quer dizer, 3? Quer dizer, 4?

Isso é tristíssimo: o Eurovision, melhor momento camp anual do mundo (chora, baile do Met), teve sua transmissão cancelada. Sim, eu sei, também estou revoltado.
Mas vou aproveitar esse momento para falar de um clássico da história do festival de música europeia. O aparecimento de Genghis Khan.

Não, não esse

Não, não esse

Nem esse.

E na verdade também não é esse:

O Brazilian Genghis Khan foi criado pelo Hélio Costa Manso, um rei do pop brasileiro que ainda não recebeu o devido reconhecimento, e era liderado pelo bailarino argentino Jorge Danel. O grupo parou em 1985 e, cinco anos depois, quando Danel pensava em retomar as atividades, Omar Leon, uruguaio que fazia o Genghis Khan em si do grupo, morreu de infarto no meio de um vôo da Europa para SP. Uma tragédia.

Mas o Brazilian Genghis Khan na verdade foi uma solução encontrada pela gravadora RGE (dirigida por Costa Manso na época), que não tinha dinheiro para trazer o Genghis Khan original para o Brasil. Então eles criaram uma versão cover. Essa história é bem contada no livro Pavões Misteriosos, do André Barcinski, e na série História Secreta do Pop Brasileiro (que tem no Looke). Vale a pena conferir!

E quem é o Genghis Khan original?

Dschinghis Khan era uma banda alemã de disco music que lançou essa música no concurso de 1979 do Eurovision. A canção homônima cantava as glórias de Genghis Khan em si (?!?) com um claro direcionamento para “outros sentidos”, se é que me entendes. Dizem mesmo que o personagem histórico Genghis Khan tinha um grande, er, apetite sexual.

O Dschinghis Khan representou a Alemanha na final, que aconteceu em Jerusalém. Ficou em quarto. Mas isso não importou muito: eles estouraram no mundo inteiro, estavam em várias coletâneas do Eurovision. Um símbolo do kitsch e de tudo que a gente ama. HAHAHAHAHA!

Looks: nota 10

Looks: nota 10

A minha música preferida deles, confesso, não é Dschinghis Khan. E sim Moskau, lançada no mesmo ano, que não foi para o Eurovision.

Uma banda alemã, mais especificamente da Alemanha Ocidental (Munique), cantando sob o nome de um imperador mongol sobre a capital da União Soviética em ritmo discoteca. Não tem como resistir.
Teria ganhado em primeiro, né? Fala sério.

Existem várias versões da música Dschinghis Khan pelo mundo. A que mais me instiga é a do Berryz Kobo, grupo de j-pop.

As meninas fizeram tanto sucesso com essa versão de 2008 que rolou um mashup remix babadeiro da original com o Berryz Koubou:

Amo demais.

Agora, não é exótico que o Brazilian Genghis Khan tenha feito sucesso (aliás, MUITO sucesso) com uma música infantil? Aiai. O pop tem um efeito relaxante em mim com as suas exoticidades.

Destaque para a forma que Bolinha fala "comer comer".

Ah: e Genghis Khan também é outra coisa!

Esse prato, hoje em dia comida típica da região de Hokkaido no Japão, recebeu o nome jingisukan porque o povo acredita que era uma comida que Genghis Khan gostava. É ótimo com uma cerveja Sapporo, viu? Risos!

Esse prato, hoje em dia comida típica da região de Hokkaido no Japão, recebeu o nome jingisukan porque o povo acredita que era uma comida que Genghis Khan gostava. É ótimo com uma cerveja Sapporo, viu? Risos!

O curta do Luca Guadagnino com trilha de Ryuichi Sakamoto

Somos muito mimados. Queremos tudo para ontem e para já. E por isso é muito frustrante que o filme The Staggering Girl simplesmente não esteja disponível para a gente assistir. É surreal! São apenas 35 minutos!!!

* a classe média branca sofre demais

Agora você provavelmente está pensando: "Ah, o Wakabara é um exagerado". Ah, é?
E se eu te disser que é a primeira vez que Julianne Moore trabalha com Luca Guadagnino?

Sim, Julianne Moore, ela mesma. E Luca Guadagnino é esse mesmo, do novo Suspiria de 2018 e do Me Chame Pelo Seu Nome (2017) - se você é classe média branca & LGBTQ você sabe muito bem do que estou falando.

The Staggering Girl é a história de Francesca (Moore), uma escritora que vive em NY e precisa voltar para Roma para buscar sua mãe que está ficando, pelo que entendi, muito velhinha.
Bom, aí ninguém menos que Mia Goth participa do filme.

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A neta da Maria Gladys é uma das coisas mais legais do filme anterior de Guadagnino, Suspiria.
(E sim, ela é a neta da brasileira Maria Gladys)
Ela faz o papel da mãe da Francesca, Sofia, quando nova.

E tem o Kyle MacLachlan!!!

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Vou fingir para vocês que gosto dele por causa de Twin Peaks mas no fundo nem curto tanto David Lynch e gosto dele por causa da série Agentes da S.H.I.E.L.D. HAHAHAHAHAHAHAHAHA
O toque MacLachlan é lynchiniano: ele faz TODOS os papéis masculinos.
Ai, que loucura. Seu lado cult suspirou, né? Eu sei que sim!

Ah, e tem a Kiki Layne!

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De Se a Rua Beale Falasse (2018), sabe?
Pelo que entendi ela é a personagem do livro que Francesca está escrevendo? Sei lá.

Não, não terminou. Você reparou nos looks?

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É tudo Pierpaolo Piccioli - ou seja, Valentino. Foi a Valentino que financiou a produção, que teve uma pré-estreia ano passado no Festival de Cannes.
Bom, só me resta dizer, depois de tudo isso, que a trilha sonora é de Ryuichi Sakamoto, o gênio por trás dos sons de Furyo, em Nome da Honra (1983), O Último Imperador (1987), O Regresso (2015) e tantos outros. Aliás, tem uma música de O Céu que Nos Protege (1990), Loneliness, que depois apareceu sabe onde? Em um dos episódios da série Pose!

Sakamoto é tudo. A trilha ainda não saiu, assim como o curta (ou média metragem?). The Staggering Girl vai ser exclusivo do Mubi, um serviço de streaming todo cult metido a besta que eu não vou querer assinar. Ai, que raiva.

Espero que pelo menos a música a gente consiga ouvir de novo

Espero que pelo menos a música a gente consiga ouvir de novo

E para quem ama Me Chame Pelo Seu Nome, sinceramente senti um clima:

A Madonna não foi no último desfile do Jean Paul Gaultier - mas olha quem foi...

Tem quem a chame de "Madonna francesa", o que particularmente acho um exagero. Coisas que críticos de música inventam para te situar rapidamente em um cenário sem precisar gastar 5 parágrafos para isso. Mas mesmo na relação entre estilista e artista, o que Jean Paul Gaultier já fez para Mylène Farmer não passa perto do impacto do as coisas que ele já criou para Madonna causaram, principalmente para a Blond Ambition Tour. Mas, bom, se não tem a rainha do pop, vai tu mesmo…

Mylène Farmer foi a atração surpresa do desfile de despedida de Gaultier que rolou na semana passada em Paris e, se ela não é famosa mundialmente, isso representou muito para o criador sim. Sem dúvida ela é uma das suas musas mais importantes, e na França ela é de fato um ícone. O look da capa de Anamorphosée, o quarto álbum de estúdio dela, de 1995, é dele - e essa é apenas a ponta do iceberg.

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Nessa época Farmer já era uma grande estrela. Alguns de seus maiores sucessos, como Désenchantée, já haviam sido lançados. Anamorphosée foi um momento de reinvenção, com Farmer tentando algo mais arriscado, se aventurando por uma sonoridade menos popzinha. Para quem não se lembra, nessa mesma época a Madonna se dava uma reinventada com R&B e música assinada por Björk em Bedtime Stories (1994). Farmer fez diferente - foi para uma sonoridade mais suja, mais… grunge?

Só que esse não foi o começo. Ela já havia vestido Gaultier em 1991, no clipe do single Je t’Aime Melancolie do álbum L’Autre

Hard Candy quem?

Também teve Que Mon Coeur Lâche de 1992, clipe meio curta: segura que o diretor é ninguém menos que Luc Besson!

Babado, hein? É toda uma confusão, tem até Michael Jackson (um ator interpretando-o, na verdade, o Christopher Gaspar, que trabalha como cover do cantor). E uma história bem doida, de Deus querendo saber o que é essa coisa de amor e mandando um anjo (Farmer em si) no lugar de Jesus Cristo. Quando Jesus pergunta “Pai, por que não me manda?” ele responde "A última vez foi um desastre".

Farmer usa um look branco no início e não se engane: esse é do mestre Azzedine Alaïa. O look de Gaultier nesse clipe é do “anjo caído": preto, sexy. Não que o primeiro não fosse sexy também…

E Besson deve ter gostado do cabelo ruivo de Farmer e do look do Gaultier: em 1997 ele lançaria O Quinto Elemento com Milla Jovovich de cabelo vermelhaço usando… Gaultier, oui.

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Farmer, assim como Madonna, se aventurou pela carreira de atriz - mas não foi com Besson. Em 1994 fez Giorgino, o longa dirigido por Laurent Boutonnat, superparceiro artístico dela que também está por trás de diversos clipes dela. Figurino: não, não era Gaultier. Quem assina é Carine Sarfati, que já tinha criado roupas para clipes da artista.

Ah, e de Anamorphosée em si tem o clipe L’Instant X, figurino Gaultier:

Reparou que a música é mais roqueira?
O figurino quase não aparece no meio de toda essa espuma. E essa abertura lateral lembra o clássico vestido Versace da Liz Hurley, com os alfinetes, sabe?

liz-hurley.jpg

O da Liz Hurley, aliás, veio antes

Em 1994

Acho toda essa estética Farmer-Gaultier bem a cara dos anos 1990, assim como a da Madonna-Gaultier.

Será que com essa aposentadoria fervida do estilista, num desfile-show que bombou, a moda vai se inspirar nas coisas dele? Tomara, eu adoro.

Look do show Stade de France de 2009, com Mylène Farmer usando um macacão que reproduz os músculos da anatomia humana assinado por Jean Paul Gaultier

Look do show Stade de France de 2009, com Mylène Farmer usando um macacão que reproduz os músculos da anatomia humana assinado por Jean Paul Gaultier