As versões do Dominó

Esse post não é bem uma homenagem ao Gugu Liberato, mas era ele o nosso Lou Pearlman, o nosso Johnny Kitagawa. Esses dois foram acusados de crimes (e também já morreram), mas o que eles possuem em comum com Gugu é a criação e a gerência empresarial de boys bands. Na conta do brasileiro temos Dominó e Polegar.

Para o meu gosto prefiro Polegar. Por causa dessa música aqui:

Juro que adoro a letra. "Eu sou um carro / Ela não guia / Sou um cigarro / Ela não fuma / Eu tô na dela / ela tá numa / Eu tô de noite / Ela de dia / Eu viro o rádio / Ela não liga / Eu peço um gesto / Ela faz figa / Toco guitarra e bateria / Ela só ouve sinfonia” - acho de uma belezura. Não sei como o Caetano Veloso ainda não regravou só com violão.

Mas-porém estamos aqui para falar do Dominó.

A formação original: Marcelo Rodrigues, Nill, Afonso Nigro e Marcos Quintela

A formação original: Marcelo Rodrigues, Nill, Afonso Nigro e Marcos Quintela

Formado há 35 anos, o grupo Dominó passou por algumas formações e lançou hits que na verdade eram versões. Sabia? Vem dar play em alguns deles.

Standing in the Twilight é um single de 1984 da dupla holandesa Maywood. A autora é a metade loira delas, Alice May. Parece ABBA, né? Gosto da versão original. Nas mãos de Dominó, virou…

Outra música do Maywood de autoria de Alice May também ganhou palavras em português no álbum de estreia do Dominó, de 1985: era Stay With Me, que virou Vem pra Mim. Não confunda com Dá pra Mim do Polegar, que é bem melhor kkkkkkkkkkkkk

O madrilenho Enrique del Pozo teve uma história de músicas para o público infantil no começo de sua carreira. E uma história bem pesada que veio à tona em 2009: Del Pozo declarou que foi abusado sexualmente por um padre quando estudava em um internato católico, aos 11 anos de idade. Mais recentemente, o artista fez uma linha de brinquedos voltada para crianças gays. Não estou zoando. Ele também dirigiu um documentário com Julián Lara sobre a repressão dos LGBT nos anos de Franco chamado El Muro Rosa.

Essa música é Camarero, a qual ele assina como um dos compositores. Já reconheceu, né?

E atenção que agora a diva vai passar.

Alaska (a cantora, não a drag) nasceu no México mas é uma das estrelas pop mais famosas da Espanha, egressa da Movida Madrileña - a mesma de onde também veio Pedro Almodóvar e Agatha Ruiz de la Prada. Essa música, Ni Tú Ni Nadie, já é da sua fase mais pop com a banda Alaska y Dinarama. Foi lançada no álbum Deseo Carnal de 1984 e depois regravada em 2010 por Fangoria, a dupla que Alaska mantém até hoje com Nacho Canut, ex-Alaska y Dinarama.
Para quem quer entender mais ou menos quem é Alaska, a MTV España fez um reality show tipo Osbournes com ela e o marido Mario Vaquerizo. É esse grau de estrela. E eu já vi ao vivo por pura sorte: estava num desfile no qual ela cantou com Bimba Bosé, Vaquerizo e Alaska ao vivo, do estilista já falecido Davidelfin. A música chamava Absolutamente e ficou na minha cabeça por cerca de um mês - portanto cuidado ao clicar no link! kkkkkkkkkkkkk

Ni Tu Ni Nadie, de Carlos Berlanga e Canut, virou Ainda Sou Você, a primeira música do primeiro álbum do Dominó.

Sentindo falta do megahit? Calma…

Sou completamente fissurado por Lucio Dalla, então sou suspeitíssimo. Tutta la Vita é do disco de 1984 dele. Dalla era superastro da Itália, inquestionável, um bolonhês que viu suas músicas ganharem versões e se espalharem por aí. Essa letra original não é tão "puta”: "Tutta la vita a far suonare un pianoforte/ lasciandoci dentro anche le dita/ su e giù o nel mezzo a una tastiera/ siamo sicuri che era musica?” Ele só se questiona sobre o que é considerado música na época, bem irônico, e não fica revolts com a vida inteira. O engraçado é que essa música também tem uma versão com… Olivia Newton-John!

No Dominó, Tutta la Vita virou "P" da Vida. E caiu na boca do povo, até hoje tem quem fale que está "P” da vida… kkkk E a versão deles é mais um… pop de protesto? kkkkkk Ai, ai…

Essa original pode ser a mais conhecida das que viraram versões do Dominó:

O maior hit do grupo de pop rock britânico White Plains foi My Baby Loves Lovin’, lançada no início de 1970. Por ter vendido muito mais esse single do que qualquer outro ao longo da carreira, o grupo ficou meio marcado por ser one hit wonder. Mas eles seguiram até 1976, mudando bastante sua formação ao longo da existência.
No Dominó, a canção reencarnou como:

“Você faz amor / faz endurecer" - que dureza, literalmente.
E ainda queria mostrar mais um hit.

O madrilenho Chao começou como cantor - seu primeiro álbum é de 1988, Amor Sin Limite, esse da capa aí de cima, lançado quando ele chegou ao México. A partir da década de 1990, ele atua em novelas mexicanas e acabou virando mais ator que músico. E portanto é uma celebridade latino-americana, apesar de suas origens européias.

Com o Dominó, Maniqui virou uma música bem fashion: Manequim. Aquela do sorriso que é um colar de marfim.

É a Luciana Vendramini, confere, produção? Amei!

ATUALIZAÇÃO 23/09/21:
Gente, eu esqueci de falar do gênio que está por trás de várias das letras dessas bandas - e ele me mandou uma mensagem me informando dessa gafe. Erro meu total, o cara é um gênio e eu aqui pasmando, sem falar sobre isso! Pois bem: Ela Não Liga, Ela Não Gosta de Mim, Companheiro, P da Vida,
Dá pra Mim, Medusa
e Manequim todas têm a letra de Edgard Poças!
Edgard também já fez letras de muita música que a gente ouviu quando era criança, tipo Amigos do Peito (Somos Amigos), Charleston, Ursinho Pimpão, A Galinha Magricela, Superfantástico e Ai Meu Nariz da Turma do Balão Mágico, quem lembra? Eu amava, hit atrás de hit! Fora Baile dos Passarinhos do próprio Gugu!
Falei na mensagem e falo em público: Edgard, você é o máximo!

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30 anos de De Volta Para o Futuro 2

Não, esse não é um post da série sobre o Brat Pack que estou fazendo, apesar de De Volta Para o Futuro 2 (1989) ser contemporâneo, da mesma década da era Brat Pack. Michael J. Fox é considerado por alguns como um membro satélite do grupo que a gente chama de Brat Pack, mas eu sinceramente não acho que tem muito a ver: a vibe é outra, os filmes que ele fez são outros. E a trilogia De Volta Para o Futuro não é exatamente sobre amadurecimento e a vida do adolescente - o seu encanto e apelo está na ficção científica de máquina do tempo e na ideia de que a gente poderia mudar nosso passado ou nosso presente para evitar um futuro que não queremos.
(Não que ela seja muito prática: o aquecimento global está aí e a gente continua com nossos hábitos de consumo; mudamos de poliéster para algodão orgânico como se esse fosse o problema…)

Hoje, exatamente hoje, faz 30 anos que De Volta Para o Futuro 2 foi lançado nos EUA.

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Gosto MUITO dessa cinessérie do Robert Zemeckis. De verdade. E o meu preferido é esse segundo. Porque, obviamente, mostrava certas coisas do futuro que faziam a gente sonhar com… o futuro.
Apesar de ser lançado em 1989, o presente para a história do longa é 1985, ano do primeiro filme. E o futuro passa para 30 anos à frente: 2015.

Para 2015, 4 anos trás, De Volta Para o Futuro 2 imaginou coisas que não aconteceram. Não temos carros voadores, por exemplo - aliás, carro é algo quase obsoleto, desejo de boomer ou de Geração X. O legal é transporte compartilhado, e se possível autômato.
Mas quais outras previsões que o longa fez?

Holograma e sequências eternas de filmes

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Uma das cenas que mais me impressionava em De Volta Para o Futuro 2 era essa. Isso ainda não existe mas temos algo parecido com a realidade virtual. E depois de shows com o holograma de Tupac Shakur, em 2020 espera-se uma turnê com uma Whitney Houston virtual no palco. Um filme chamado Finding Jack, ainda sem data de lançamento, chamou a atenção porque vai usar um CGI (imagem gerada em computador) de James Dean, que morreu em 1955. E não é só: antes os diretores Anton Ernst e Tati Golykh queriam Elvis Presley!
Falando em indústria cinematográfica, o comentário sobre sequências cinematográficas (o holograma se refere a uma fictícia 19ª sequência de Tubarão) já era um tanto real na época. Em 1988 foi lançado Sexta-Feira 13 Parte VII: A Matança Continua. O mesmo ano viu A Hora do Pesadelo 4 - O Mestre dos Sonhos. Um ano antes, o 4º filme da cinessérie Tubarão estreava: Tubarão - A Vingança.
De Volta Para o Futuro em si, que bom, ficou só na trilogia mesmo.

Hoverboard

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Um sonho de uma pessoa (eu) que nem andar de bicicleta sabe. Hoverboard. O skate voador não virou uma realidade. Ou melhor, mais ou menos. Assiste aí:

Passadah? Eu também. Dizem que o hoverboard da Lexus custa US$ 10.000. E ele anda sobre a água, ao contrário da sua versão fictícia. Não é exatamente uma realidade acessível. Mas imagina se vira? Por enquanto, o condado de Pinheiros e adjacências se vê invadido de… patinetes. O que soa muito anos 1980, né?

Refrigerante inflacionado

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A Pepsi Perfect custa US$ 50 no longa e choca Marty McFly (Fox). Sabe nada, inocente. A Pepsi em si lançou uma edição comemorativa em 2015 e ela custava US$ 20,15 na época (para formar o ano 2015 no preço). O tempo passou e hoje existem unidades à venda na Amazon por… US$ 230. É pegar ou largar.
(Um refrigerante normal em SP custa uns R$ 5 na padoca, o que significa cerca de US$ 0,0007)

Marty ficaria certamente chocado com outros preços, como o do tênis Nike Air Foamposite, que está por volta de R$ 1.100 no Brasil (ou, na conversão, cerca de US$ 6).
O que nos leva ao próximo tema…

Nike Air Mag

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O tênis que amarra sozinho, sonho de adolescentes preguiçosos, virou realidade. A Nike lançou 89 pares em 2016 que já se esgotaram e hoje você só conseguiria em leilões disputados. O original do filme foi vendido por quase US$ 100.000 em um leilão que rolou em 2018.

Também existe o Hyper Adapt 1.0, que segue mais ou menos a mesma lógica, também é da Nike e foi lançado há alguns anos. Que eu saiba não está mais sendo produzido. A diferença é que ele não tem a carinha do tênis do De Volta Para o Futuro - é mais contemporâneo.

Gadgets vestíveis

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Os óculos fazem chamada, coisa supernormal. Também temos smartwatches, bolsa que carrega celular (a da Alê Farah é tudo, corre atrás)… Mas acho que o mais-mais é o smartphone mesmo, que virou um acessório: a partir dele você faz várias coisas mas também concretiza o seu estilo. Tem capinha, tem a marca dele, tem penduricalho e adesivo que você pode colocar, tem os aplicativos que você usa. Tudo isso faz parte da expressão da identidade, tal qual moda e hobbies.
Eu, por exemplo, fiquei DOIDO quando vi o novo Moto Razr. Não existe coisa mais icônica que celular de flip - e agora existe um smartphone de flip!!!

A nova versão de um ícone: mimdá!

A nova versão de um ícone: mimdá!

Falando nisso: tablet ou smartphone?

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Seja o que for: talvez esse gadget seja a previsão mais certeira de De Volta Para o Futuro 2.

Comida desidratada

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Não existe um "hidratante de comida” - ainda. Mas existe comida desidratada, né? É diferente da pizza fictícia da Pizza Hut, certamente, que tinha a ideia de ser pequenininha e crescer pencas.

Mas você conhece a comida liofilizada? Gente que acampa e faz trilhas pode optar por comer esse tipo de coisa, com prazo maior de validade, preparo simples - e dizem que mantém as propriedades dos alimentos. Geralmente é só acrescentar água e, se você quiser, alguns temperos, ferver um pouco e pronto. Então é mais ou menos o que aparece no filme, mas não é algo normal, da nossa vida cotidiana.

Diria que a tendência desse nosso futuro é que cada vez mais gente não queira alimentos industrializados, na verdade. Ou seja, é a contramão disso.
Na polêmica do hambúrguer plant-based, você é de qual time? O que prefere um hambúrguer caseiro feito de carne e sem processos industriais (porém sustentando uma indústria pecuária) ou um industrializado que imita carne mas é cruelty free?
Sinceramente não sei responder o que acho melhor em questões éticas e saudáveis, mas… prefiro o de carne normal no sabor. E quando não quero comer carne nem nada de origem animal, prefiro outras opções, de preferência não-industrializadas.

Videoconferência

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"Vamos fazer uma call?"
”A gente pode marcar um Skype"
"Faz um Facetime, uai!”
Afff. Odeio.
Bom, é melhor que reunião presencial.

Biometria

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Inclusive para pagamento. Existe. Tá aí.
É confiável? Acho que sim, né, mas às vezes acho que dá ruim.
Por exemplo… em 2013, médicos e enfermeiros foram flagrados usando dedo de silicone para fraudar ponto em SP. Que tal?

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Ah, e existe uma outra ligação do Brat Pack e a cinessérie De Volta Para o Futuro. Lea Thompson! A mãe de Marty McFly também pode ser considerada um membro satélite, porque participou do último filme adolescente com roteiro de John Hughes: Alguém Muito Especial, de 1987. Ela era a lindinha Amanda Jones, objeto do desejo do personagem principal. Em De Volta Para o Futuro 2, ela aparece um pouco… turbinada, digamos.

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No longa o decotão é mais um dos símbolos de decadência de um futuro alternativo. Uma visão certamente moralista - Zemeckis certamente não esperava que um sistema de busca de imagens chamado Google Images tivesse começado com um decote ainda maior que esse.

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Onde o forró, o brega e o punk se encontram: Getúlio Abelha

Getúlio Abelha já está por aí desde 2017 e como é que a gente ainda não conhecia? Fui no show que rolou em SP ontem, 21/11, e que bom que eu fui! Foi o meu marido que me avisou que era legal - Getúlio nasceu no Piauí mas mora em Fortaleza desde 2012, e como tudo que tem a ver com o Ceará a gente amou <3

Getúlio é o desenvolvimento de uma cena, um filho do indie dos anos 2000, só que contemporâneo nas questões que aborda. Lembra que no Popload que aconteceu esse mês a Lovefoxxx, vocalista do Cansei de Ser Sexy, comentou que hoje não ia poder fazer música sobre a Paris Hilton? É bem por aí: Getúlio faz música sobre sexualidade e gênero, sobre costumes e preconceitos - inclusive os induzidos por instituições religiosas. E não perde nem o humor, nem a musicalidade e a comunicação visual, que são ricas no mix da cultura popular nordestina com referências do punk, do gótico, do electro.

E misturar hits de Dorgival Dantas, Magníficos e outros no show é maravilhoso.
Desculpa não ter avisado dessa vez sobre o show, não sabia que era tão bom. Fica ligado para não perder de uma próxima!

Ah, e alguma coisa em Getúlio me lembra o português Conan Osíris. Então leia mais sobre o Conan Osíris aqui!

Um elo entre Procura-se Susan Desesperadamente e... Marisa Monte

Kkkkkk esse título é maravilhoso, né?

Sim, existe um elo entre Procura-se Susan Desesperadamente (1985) e Marisa Monte. Você lembra do filme? Se nunca assistiu, deveria. E nem é pela Madonna, o longa é bem divertido, mesmo!

Um dos primeiros veículos da então princesa do pop do momento, a personagem Susan se mesclou com a de Madonna: ela era misteriosa, sexy, dominadora, desafiadora das convenções, jovem, com um estilo de se vestir arrojado, atrevida. Os homens a queriam e Roberta (Rosanna Arquette), a dona de casa entediada, queria ser como ela. Uma jaqueta que Susan vende em um brechó (Love Saves the Day em East Village, NY, fechado desde 2009) e que Roberta compra e usa faz com que a segunda assuma a identidade da primeira. O poder da moda, não?
A jaqueta foi vendida num leilão em 2014 pela bagatela de US$ 225.000.

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Illuminati, anyone?

Nas costas da jaqueta lê-se Novus Ordo Seclorum: a imagem é uma reprodução do selo da nota de dólar e quer dizer "nova ordem dos séculos” ou "nova ordem mundial”

Mas vamos para a ligação: nem todo mundo sabe mas Procura-se Susan Desesperadamente conta com diversas participações especiais. Por exemplo: a maravilhosa mulher que vende cigarros, do diálogo maravilhoso “Susan! Meu Deus, a gente achou que você estava morta” e a resposta “Eu estava em New Jersey”, é Ann Magnuson. Antes da drag queen Katya sonhar em ser Katya, Magnuson fazia uma personagem de cabaré chamada Anoushka, uma cantora soviética que interpretava músicas pop americanas com sotaque russo. A camarada também fazia parte de um grupo bem doido de música e performance chamado Bongwater. Ou seja, era da ceninha alternas de NY. Outra participação: Richard Hell, co-fundador do Television, é o cara que Susan dispensa logo no começo.

Agora, lembra da aparição dos trigêmeos que foram separados e depois se reencontraram e em 2018 viraram um documentário, o Três Estranhos Idênticos? É por um segundo, se você piscar você perde: Susan desce do carro para ir para a redação do jornal e se depara com eles.

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(Aliás, assistam o doc, é legal)

Logo depois disso, Susan pede um classificado no balcão. O cara lê: "Procura-se estranha que procura Susan desesperadamente” etc etc., e ela responde “Ela vai amar".
Esse cara é o elo. O nome dele, meus caros, talvez, se você for um geek da música, te desperte algo… é Arto Lindsay.

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Nessa época Lindsay também era parte da ceninha. Membro ativo da no wave do fim da década de 1970, fez parte do grupo DNA na guitarra e vocais. Atenção, é BEM experimental, tá?

Os pais de Lindsay eram missionários. Então, apesar de ser norte-americano, ele passou anos entre Recife e Garanhuns. Cresceu vendo o tropicalismo dando frutos. Isso causou um impacto que ficou mais óbvio na dupla que formou com Peter Scherer após Procura-se Susan Desesperadamente, a Ambitious Lovers. Entre as coisas que eles fizeram, está essa versão linda de É Preciso Perdoar do repertório de João Gilberto, de 1991:

Nessa época ele já estava bem mergulhado na música brasileira contemporânea: a dupla do Ambitious Lovers que produziu Estrangeiro (1989) de Caetano Veloso. E finalmente a gente vai chegando perto de Marisa Monte: o segundo álbum da cantora, aquele em que ela diz tchau para Nelson Motta para se encontrar ("Deixe-me ir / preciso andar / vou por aí / a procurar…"), é produzido por Lindsay. Mais (1991) reafirma o ecletismo de Marisa só que também mostra o lado compositora dela. O hit Beija Eu é dela, Arnaldo Antunes e Arto Lindsay.

Essa visão cosmopolita, esse lado quase experimental (em Borboleta, nas misturas de Ensaboa com músicas incidentais, e que também está em Estrangeiro) me parecem tanto vontades dos músicos como a cara de Lindsay. Isso, na minha opinião, ainda é reforçado em Verde Anil Amarelo Cor-de-Rosa e Carvão (1994), outro produzido por ele, um marco que reconstrói a MPB sob essa pecha eclética. A partir daí, toda nova cantora teria uma outra matriz de inspiração, especialmente na questão de repertório, por mais que gente como Nara Leão e a própria Elis Regina já trabalhassem nesses resgates de músicas "vintage", cada uma à sua maneira. A diferença, acredito, é que o novo vintage eram contemporâneos dessas cantoras: Marisa absorve pérolas de repertório de Tim Maia, Jorge Ben Jor, Roberto e Erasmo Carlos, sambas de Candeia, Paulinho da Viola, Jamelão.
Isso sem contar as participações especiais, né? Ryuichi Sakamoto nos teclados de várias faixas de Mais, Laurie Anderson em Enquanto Isso de Verde Anil Amarelo. Lindsay trabalhou com Sakamoto desde a década de 1980, e conhece e trabalha com Anderson desde a tal ceninha de NY.

Também é óbvio que Verde Anil Amarelo e mesmo o Mais são sementes do que depois virou o fenômeno Tribalistas.

Lindsay ainda produziu Barulhinho Bom (1996) e Memórias Crônicas e Declarações de Amor (2000). Universo ao Meu Redor (2006) ficaria nas mãos de outro meio-brasileiro-meio-gringo, o paulistano Mario Caldato Jr.

Voltando um pouquinho, só de brinks:
VOCÊ SABIA que Marisa Monte namorou Nasi? Sim, ele mesmo. O vocalista do Ira!. O relacionamento começou em 1988 e durou um ano e meio. Ou seja, antes do lançamento de Mais. Mas não, me parece que Ainda Lembro não seria uma música composta para ele - ou seria? Marisa divide os créditos da composição com Nando Reis, outro namorado dela. Foi um encontro babadeiro: toda a caligrafia do encarte de Mais, para você ter uma ideia, é de Reis!
A história conta que Marisa já tinha começado a escrever Ainda Lembro (eita…) e Reis ajudou a terminá-la.

Eu adoro: é pop gostoso, é um encontro muito feliz de vozes lindas (dela e de Ed Motta).
Resposta, do repertório do disco Siderado (1998) do Skank, é uma música que Reis fez sobre o término com Marisa. Interessante: já reparou na letra? "Bem mais que o tempo / que nós perdemos / Ficou pra trás também o que nos juntou / Ainda lembro / que eu estava lendo / só pra saber o que você achou / dos versos que eu fiz / ainda espero / resposta".
O “ainda lembro” é uma referência à outra música? Ele quer dizer que ainda espera uma resposta dos versos que ele fez em Ainda Lembro? E quais são os versos? Seriam os cantados por Ed Motta? “Eu errei com você / e só assim / pude entender / que o grande mal que eu fiz foi a mim mesmo"?

A digressão foi enorme! Sorry!
Por fim, fiquem com Onde Você Mora?, que originalmente foi gravada pelo Cidade Negra e também é uma composição de Marisa e Nando. Gosto muito dessa música <3 Ela bem que podia regravar em estúdio.