Joni Mitchell e as canções que ela fez para eles
Você, fã da Taylor Swift, fica aí pesquisando sobre os ex-namorados dela e as músicas que ela fez para cada um. Bom, em algum momento dos anos 2010, alguém inventou de querer fazer a cinebiografia de Joni Mitchell, Carole King e Carly Simon, o trio parada-dura de cantoras do folk norte-americano.
E aí parece que Swift se empolgou para querer fazer o papel de Mitchell, mas Mitchell logo a mandou tirar seu cavalinho da chuva! Ela mesma conta que falou para o produtor: “Tudo o que você tem é uma garota com as maçãs do rosto altas.” The shade… O livro no qual o filme ia se basear, Girls Like Us, é, segundo Mitchell, "suposições, suposições, suposições.” Três vezes! Suponho que isso seja suposição a dar com o pau.
E a verdade é que, bem, Mitchell não parece muito fã de Swift nem das comparações. Sim, ela teve um monte de namorado famoso. Sim, ela fez músicas para eles. Mas para que comparar? Respondo por ela: porque é divertido, desculpa qualquer coisa.
Esta lista de músicas que Mitchell fez para os ex é baseada em suposições, suposições, suposições. Não a levem a sério!
Coyote, 1976, sobre Sam Shepard
No regrets, Coyote
We just come from such different sets of circumstance
O álbum Hejira foi composto em sua maior parte numa viagem de carro que Mitchell fez pelos EUA. O nome vem do árabe hijra, que quer dizer partida ou jornada. Refere-se à migração do profeta Maomé de Meca a Medina em 622. Mas Coyote começou antes.
Precisamos ter um contexto anterior: a turnê Rolling Thunder Revue, de Bob Dylan, rolou entre 1975-76 e Mitchell participou de alguns shows no fim de 1975. Lá, ela começou a usar cocaína com mais frequência (juro que essa informação é importante lá no fim do post). E também foi ali que ela encontrou Sam Shepard, contratado por Dylan para fazer um roteiro de filme baseado nos acontecimentos da turnê. O filme saiu como Renaldo and Clara em 1978, uma mistura de documentário e ficção, e Shepard ainda lançou um livro sobre a experiência da tour.
Coyote não só fala do breve relacionamento entre Mitchell e Shepard mas também de outras coisas que a cantora viu na turnê. E em uma das apresentações, Mitchell mostrou uma versão beta de Coyote. Tipo “olha no que estou trabalhando, pessoal!".
Shepard fala sobre Mitchell no livro, claro.
”She stands there in the midst of it, making believe she’s tuning an already well-adjusted guitar until the place calms down. No doubt the element of surprise, of the audience not knowing she’s on the bill, is partly responsible for the explosions, but there’s something more important in it – the fact that people listen to her every word. Her music’s nothing outrageous, but her word maneuverings tend to verge on uncanny.”
Blue, 1971, sobre David Blue
Hey, Blue
Here is a song for you
Ink on a pin
Underneath the skin
An empty space to fill in
Dizem que a música foi feita para David Blue, compositor que fazia músicas com Mitchell, mas ninguém tem certeza se é apenas uma coincidência no nome e Mitchell já negou. Em teoria, eles nunca tiveram um relacionamento amoroso.
Blue, o músico, nunca chegou a ser uma estrela como Dylan, a própria Mitchell e outros contemporâneos seus. Virou cult.
David Blue aparece em Renaldo and Clara, veja só. Participou de alguns outros longas e até de uma peça, American Days de Stephen Poliakoff, além de ter lançado uma série de discos.
Willy, 1970, para Graham Nash
Willy is my child, he is my father
I would be his lady all my life
He says he'd love to live with me
But for an ancient injury
That has not healed
He said I feel once again
Like I gave my heart too soon
Nessa ela quase não disfarça: William era o nome do meio de Graham Nash do trio Crosby Stills & Nash. E Willy seria uma resposta para Our House, música do Graham Nash sobre a casa de Mitchell em Santa Monica. E para um certo ataque de siricutico de Nash, que decidiu que não estava pronto para o amor. É o que a letra dá a entender…
I Had a King, 1968, para Chuck Mitchell
I can't go back there anymore
You know my keys won't fit the door
You know my thoughts don't fit the man
They never can, they never can
Afff, que música, senhoras e senhores. Ela foi feita para o primeiro marido de Mitchell, Chuck. Depois de casarem, os dois se apresentavam como uma dupla. O nome de solteira de Joni é Roberta Joan Anderson, ela trocou o sobrenome por Mitchell ao casar. Pela data e pela letra, é meio óbvio que a canção fala sobre a separação.
Tem quem defenda que The Last Time I Saw Richard de 1971 também seria para Chuck. Faz sentido se a gente pensar em Detroit e que ele casou de novo, a mulher é uma dona de casa… As coisas se encaixam.
Cold Blue Steel and Sweet Fire, 1972, para James Taylor
Cold blue steel out of money
One eye for the beat police
Sweet fire calling
"You can't deny me
Now you know what you need"
Polêmicaaaa: Mitchell canta sobre o vício do então parceiro James Taylor em heroína. Eles estiveram juntos entre 1970 e 1971 – e a troca também era artística, com o casal se apresentando junto. Dizem que All I Want, do álbum Blue de 1971, também é para ele. Quem toca violão nessa faixa é o próprio Taylor. O relacionamento terminaria no mesmo ano, deixando Mitchell devastada.
Mais para Taylor:
. See You Sometime, de 1972.
A Case of You, 1971, para Leonard Cohen
Just before our love got lost, you said
"I am as constant as a northern star, " and I said
"Constantly in the darkness
Where's that at?
If you want me, I'll be in the bar"
James Taylor tocou violão nessa mas a música é claramente para Cohen. Mitchell cita o Canadá, terra natal dele, e até a mãe de Cohen, que teria a boca parecida com a dele.
Mitchell e Cohen foram “algo” entre 1967 e 1968. Eles se conheceram no Newport Folk Festival e a cantora explica que admirava muito a música Suzanne, de Cohen.
Ela também conta que o poeta e músico ficou bravo quando descobriu que ela tinha usado a frase que ele disse para ela: “sou tão constante quanto a estrela do norte". Que idiota! HAHAHAHAHA! Pede direito autoral e assina o recibo, então, bobinho!
Outras de Mitchell que são para ele:
. That Song About the Midway, de 1969 (David Crosby diz que na verdade a música é sobre ele. E agora? Talvez seja para os dois…)
. Rainy Night House, de 1970. “I went one time to his home and I fell asleep in his old room, and he sat up and watched me sleep. He sat up all the night and he watched me to see who in the world I could be.” – Mitchell em entrevista para Malka Marom.
Carey, 1971, para Cary Raditz
Come on down to the Mermaid Cafe
And I will buy you a bottle of wine
And we'll laugh and toast to nothing and
Smash our empty glasses down
Mais uma do clássico Blue! Carey é Cary Raditz, um chef que Mitchell conheceu numa comunidade hippie em Matala, vila de pescadores da ilha de Creta, Grécia, em 1970. O Mermaid Cafe realmente existia. No refrão, Mitchell fica chamando Carey de "mean old daddy". Imagina ficar conhecido por esse aposto pro resto da vida?
A música foi um presente de aniversário de Mitchell para Raditz. Dizem que California, do mesmo álbum, também é para ele.
Free Man in Paris, 1974, para David Geffen
The way I see it, he said
You just can't win it
Everybody's in it for their own gain
You can't please 'em all
There's always somebody calling you down
Olha ele aí outra vez. Geffen não era um namorado e sim o agente de Mitchell! A música claramente fala de como o executivo se sentia mais livre em Paris do que com seus compromissos nos EUA. “Thinking how I'll feel when I find / That very good friend of mine” pode se referir a algum, er, "amigo". Como já disse em outro post, Geffen é gay.
Elton John, outro homossexual assumido poderoso na indústria da música, apresentou Free Man in Paris em um show-tributo para Mitchell em 2000.
Blue Motel Room, de 1976, para John Guerin
I know that you've got all those pretty girls coming on
Hanging on your boom-boom-pachyderm
Will you tell those girls that you've got German Measles
Honey, tell them you've got germs
I hope you'll be thinking of me
Because I'll be thinking of you
While I'm traveling home alone
Tell those girls that you've got Joni
She's coming back home
Recado dado: ele tem dona, baby! Mitchell se aproximou de Guerin enquanto planejava o disco Court and Spark em 1973. Como o jeitão das músicas era meio jazzy, ela precisava de um baterista nessa linha. Dizem que era um relacionamento ioiô, com eles voltando e se separando toda hora, traindo um ao outro. Ao que tudo indica pela música, Mitchell estava com Guerin enquanto viajava – aquela viagem que comentei que deu no disco Hejira.
Fun fact: Mitchell conheceu Shepard enquanto ainda estava com Guerin, e compôs Coyote nesse meio tempo. Mitchell cantava Coyote na turnê de The Hissing of Summer Lawns em 1976, onde ela mandava a real dizendo que compôs a música na turnê com Bob Dylan, OU SEJA, é só fazer as contas, né, Guerin? Seja esse o principal motivo ou não, teve uma briga feia entre os dois e a turnê foi interrompida… para sempre. Assim como o relacionamento deles.
The Dawntreader, 1968, para David Crosby
City satins left at home I will not need them
I believe him when he tells of loving me
Something truthful in the sea your lies will find you
Leave behind your streets he said and come to me
Come down from the neon nights
Come down from the tourist sights
Run down till the rain delights you
O próprio David Crosby (ele mesmo, do Crosby Stills & Nash… vixe, que troca-troca!) diz que essa música é para ele. O artista explica que mostrou a cena musical de Los Angeles para Mitchell durante um breve relacionamento que tiveram no começo da carreira solo dela. Ele também é o produtor do primeiro álbum de Mitchell, Song to a Seagull, de onde saiu essa música.
Crosby disse que ainda a ama em entrevista de 2019. Supera, baby!
Not to Blame, 1994, para Jackson Browne
The story hit the news
From coast to coast
They said you beat the girl
You loved the most
Mitchell teve um relacionamento rápido com Jackson Browne e, dizem, Fountain of Sorrow de 1974 foi feita por ele para ela. Depois de um tempo, Browne, que seguiu sua vida e começou outros relacionamentos, saiu no noticiário como o motivo do suicídio de Phyllis Major, sua primeira mulher. Ele também teria cometido violência física contra a namorada Daryl Hannah em 1992 (quando a relação entre os dois acabou). Not to Blame fala dessas coisas, mas não dá para ter certeza que é sobre Browne mesmo. Mas olha… parece, viu.
Também dizem que a fofa Car on a Hill, de 1974, é para ele. Bem mais leve…
(Mitchell já revelou que teve um relacionamento abusivo com o baterista Don Alias. O infame muso de Not to Blame pode ser uma mistura de Alias e Browne.)
Pergunta básica: Neil Young nunca ganhou uma música?
Ganhou, mas é mais complexo que isso. A "quarta ponta" de Crosby, Stills & Nash fez uma música chamada Sugar Mountain na década de 1960 sobre juventude e amadurecimento. Mitchell “o respondeu” com The Circle Game em 1970.
Young, por sua vez, tem uma música nunca lançada oficialmente chamada Sweet Joni.
Oficialmente eles nunca tiveram nada romântico.
Em 2017, o lançamento da biografia de Mitchell Reckless Daughter: A Portrait of Joni Mitchell de David Yaffe causou. Isso porque, na entrevista que ela deu para ele, a artista falou algumas coisinhas sobre os seus ex-namorados e outros colegas e, bem… FEZ A SINCERONA.
Sobre James Taylor: "incapaz de ter um relacionamento."
Sobre David Crosby: “produtor incompetente."
Sobre Chuck Mitchell: culpado de "burrice acadêmica.”
Sobre Neil Young: desafinado.
Sobre Sam Shepard: "o achei muito atraente quando estava usando cocaína."
Em 2010, aliás, ela já tinha soltado o verbo para o LA Times…
Sobre Bob Dylan: “Ele é um plagiador, sua voz e seu nome são falsos."
Sobre Gracie Slick e Janis Joplin: "Dormiam com todos das bandas delas e caíam de bêbadas."
Sobre Madonna: “Americanos decidiram ser burros e rasos desde 1980. Madonna é como Nero, ela marca o ponto de virada.”
Sobre Jimi Hendrix: “o cara mais doce.”
Que eu saiba, Mitchell nunca fez uma música para Jimi Hendrix.
Laurel Canyon, o lugar em Santa Monica onde quase todo esse povo morava (mais Frank Zappa, Mama Cass, os integrantes do The Doors), virou tema de um documentário lançado em duas partes no canal a cabo norte-americano EPIX. Passou faz quase um mês. Ainda não assisti, mas QUERO. É tipo Barrados no Baile, né? Risos!
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