Cicciolina e coisas que vão te surpreender agora (você era muito novo pra entender!)
Não gostava da figura da Cicciolina quando era pequeno. Não sei se por moralismo – acho que não, eu era pequeno demais para entender e tinha coisas que eu gostava e eram bem, er, liberadas. Mas eu tinha uma aversão inexplicável. Tipo não ia com a cara, mesmo. Também não acho que era minha homossexualidade de criança viada escolhendo um lado… talvez. Será que a minha homossexualidade se sentia ameaçada? Risos!
Para resumir a questão, fui assistir ao documentário Os Escândalos de Cicciolina, disponível no GNT Play e no Now (para quem é assinante dos canais da Globosat). E descobri que na verdade eu sabia pouquíssimo sobre a Cicciolina, e que hoje eu acho a Cicciolina o máximo!
Claro que, influenciado pelo doc, me deixei levar por uma obra que é claramente favorável a ela. Pouca gente problematiza o alter-ego de Ilona Staller no programa (que tem menos de uma hora), e quem o faz tem a sua capacidade analítica discretamente colocada em xeque (leia-se: uma francesa que faz parte do Femen e paga de doida etc.).
Mesmo assim, decidi revisar minha opinião sobre Cicciolina com profundidade. Reduzida à atriz pornô, ela é certamente muito mais do que isso. Um ícone. Um mito vivo. Provocante e inocentemente dionisíaca com seu ursinho de pelúcia. Ela sabia tudo o que estava fazendo e promovendo? Era manipulada? Era dona de sua própria sexualidade ou reforçava a objetificação da mulher? Era vanguardista? Era feminista, apesar de ser odiada pelas feministas? Era uma vigarista?
Acho que ela era (e é, ainda está viva aos 68 anos) uma personalidade complexa, que a gente não consegue definir com poucos adjetivos.
Por exemplo: ela afirma que perdeu a virgindade aos 18 anos. Tá boa?
Segue aqui o meu quinhão.
Cicciolina não é italiana
Pois bem. Ela é húngara. Nasceu em Budapeste numa Hungria dominada pelos soviéticos e portanto em regime comunista. Foi Miss Hungria. Casou (com um italiano). E isso tudo antes de virar a Cicciolina. Mais chocante ainda: Cicciolina foi espiã!!!
Cicciolina: a Mata Hari húngara
A própria Ilona conta em biografia que ajudou o governo da Hungria com informações sobre diplomatas americanos que se hospedavam no hotel de luxo onde ela trabalhava do meio para o fim dos anos 1960!
E não é só: ela também diz que fez o mesmo tipo de serviço, já na Itália, mas que tem medo de falar sobre o assunto e acabar assassinada ou com algum parente prejudicado.
Na Itália: um programa erótico… de rádio!
Ao se separar do marido mas já morando na Itália, Cicciolina encontrou com Riccardo Schicchi, o pornógrafo que a ajudou a construir sua imagem. E foi em 1973, já em Roma, que ela começou a fazer o programa de rádio Voulez-vous Coucher Avec Moi?, no qual ela dava dicas de sexo e falava de sexo, mas para ela, estava falando de amor. Assumiu o nome Cicciolina na rádio e posou em fotos hoje clássicas de Schicchi.
Uma influência para… Xuxa?
Olha, eu não sei, mas tem algo aí, viu.
Cicciolina, que é um nome inventado, se despedia dos ouvintes com "bacini bacini bacini", que é "beijinho beijinho beijinho” em italiano. Ela também batizou seus fãs de cicciolini, mais ou menos do mesmo jeito que a Xuxa falava dos seus baixinhos.
A beleza loira magnética, pouca roupa, esse ar de lolita.
Não tenho provas, mas tenho indícios…
Cafona ou cult?
Cicciolina já foi musa de muita gente. Em 1976, um filme italo-iugoslavo de Miklós Jancsó chegava no Festival de Cannes e causava escândalo: era Vizi Privati, Pubbliche Virtù. Supererótico, ele trazia as aventuras de um herdeiro de um trono na virada do século 19 para o 20 e era bem visual, com orgias e nudez frontal. Cicciolina estava ali mas num papel secundário: era uma participante da orgia. Nudez nunca foi problema para Ilona Staller: tal qual Dercy Gonçalves, bobeou ela tava colocando a teta pra jogo – na rua, na TV, no restaurante…
A coisa já seria diferente em 1989, elevada de maneira polêmica ao status de arte. Casada com o artista Jeff Koons, Ilona participou da série Made in Heaven, na qual Koons investigava a estética pornô e tudo que a atriz construiu com Schicchi.
Desde 1983 Cicciolina tinha ido além de ficar pelada e insinuante em qualquer lugar que lhe desse na telha e começou a atuar em filmes pornô hardcore. Então Koons sabia bem o que estava fazendo. Quando se separaram, a briga foi feia e bem litigiosa – tanto que, dizem, Koons destruiu quase todas as obras que compunham Made in Heaven num acesso de raiva.
Imagina ser filho da Cicciolina com o Jeff Koons?
Ele existe. Ah, sim. E seu nome é Ludwig Koons.
Centro de uma disputa de guarda na separação, Ludwig acabou ficando com a mãe. Hoje, tem quase 30 anos, sonha com uma carreira por trás das câmeras de cinema e declarou em 2019 que, se fosse cidadão norte-americano, votaria no Donald Trump.
Putz…
E a mãe dele, hein? Bom…
O primeiro partido de Cicciolina era… ANARQUISTA
Nem sei o que dizer! A fama pop de Cicciolina se deve muito a ela não ter se conformado só em ser uma celebridade da mídia, uma mistura de artista e pornógrafa. Ela entrou para a política e acabou eleita, ocupando uma cadeira no parlamento italiano entre 1987 e 1991. Muita gente acha tudo isso uma grande palhaçada, mas o mais, digamos, original é que esse partido com o qual Cicciolina conseguiu ser uma das mais votadas era o Partito Radicale, de raízes anarquistas!
Antes disso, Cicciolina diz que já se envolvia com política antes, inclusive com uma tentativa de fundação de um partido verde que não deu certo. Ela já afirmou, em entrevistas, que é de esquerda.
Cicciolina piu pop
Cicciolina já inspirou tantas que fica difícil enumerar. Miranda Kerr já posou como ela para a V Magazine em 2013. Fausto Fawcett compôs a música Cicciolina (O Cio Eterno), lançada no álbum dele de 1989. Em 1990, o grupo eletrônico Pop Will Eat Itself lançou a música Touched by the Hand of Cicciolina. E adivinha só onde uma música inspirada nela quase foi parar…
Erika Vikman concorreu com essa música à vaga finlandesa do Eurovision 2020. Tem coisa mais perfeita? Quase ganhou – ficou em segundo lugar. De qualquer forma, o Eurovision acabou não acontecendo nesse ano.
A própria Cicciolina já lançou discos
Não que isso seja estranho, né? Era comum que artistas que não cantavam nada gravassem discos mesmo assim para tentar capitalizar ainda mais em cima de sua fama (leia-se Xuxa… risos).
No primeiro disco que gravou, chamado Ilona Staller e lançado em 1979, tem uma faixa deveras interessante. Cavallina Cavallo foi composta por Ennio Morricone, ele mesmo, para o filme Dedicato al Mare Egeo (que pelo que entendi foi lançado apenas no mercado japonês). A versão que aparece no longa, que traz Cicciolina como uma de suas estrelas, não é essa e sim a com a voz da cantora Edda dell’Orso.
Olha outra faixa desse mesmo disco:
Existe um álbum lançado somente no Brasil, o Sonhos Eróticos (1988), que tem duas músicas de Cicciolina, Muscolo Rosso e Avec Toi, com outras interpretadas pela Erotic Dreams Band (provavelmente uma banda de estúdio assumindo esse nome) e La Prima Volta contendo trechos de falas de Cicciolina.
Muscolo Rosso se refere a ele mesmo. O pinto.
Cicciolina na TV brasileira
É! Cicciolina já participou de uma novela! Você não lembra?!
O babado era certo. Xica da Silva, que passou na Rede Manchete entre 1996-97, teve Cicciolina no papel de uma princesa de Gênova. Para quem não lembra, Xica da Silva tinha um certo ar de pornochanchada. Nada explícito, mas tudo muito… sugestivo!
Teve outro momentinho de Cicciolina na TV nacional. Esse aqui:
QUEM AMA UMA ENTREVISTADORA??? EU!
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