Finalmente um filme sobre um cantor que realmente quero assistir

Esqueça o filme do Elvis.
Esqueça o filme do Bowie.
O filme que você também quer está mais próximo do lançamento que você pensa. Aliás, ele já estreou - em Portugal. E não sei se chega aqui mas já estamos trabalhando com torrent - por favor me mandem.
Você conhece o António Variações?

Pouca gente conhece Variações no Brasil - ele ainda é algo a ser descoberto por essas praias. Compositor português que lançou álbuns no começo dos anos 1980, era barbeiro. Depois do lançamento de dois ótimos álbuns, ficou muito doente. Morreu vítima de uma broncopneumonia em 1984 que, especula-se, era decorrente da Aids. Em Portugal o artista é mais bem lembrado - vide filme recém-lançado que, em uma semana em cartaz, já é o filme português com maior bilheteria do ano.

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Não são só as músicas de Variações que impressionam. O apuro visual também é incrível - ele já sabia, na Lisboa da época, que era importante ter um trabalho em imagem para além da obra musical no mundo pop. São fotos e vídeos que impressionam até hoje. Além da música, Variações é ícone queer.

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Com um pouco de esforço, dá para fazer um paralelo entre Ney Matogrosso no Brasil na década de 1970 e Variações em Portugal na década de 1980. O país passou pela Revolução dos Cravos um pouco antes, em 1974; depondo a ditadura do Estado Novo de décadas. A Assembleia Constituinte de 1976 garantiu a democracia - o processo todo também inclui a independência das colônias portuguesas na África. Ou seja, António aparece num processo de abertura e democratização; Ney era provocação pura no Secos & Molhados e depois solo, numa sociedade que ainda passava pela ditadura militar e só veria o movimento de Diretas Já quase 10 anos depois.

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Vamos às músicas de António, então: no primeiro álbum, Anjo da Guarda, tem uma das minhas preferidas. Chama-se O Corpo é que Paga - esse clipe abaixo tem um minuto inicial do clipe original e o resto é uma edição de um fã.

A letra tem duplo sentido e é simplesmente mara: “Quando a cabeça não tem juízo / Quando te esforças mais do que é preciso / O corpo é que paga / O corpo é que paga / Deix'ó pagar, deix'o pagar / Se tu estás a gostar...” E depois segue falando de ansiedade, estresse e seus efeitos na saúde, até comer compulsivamente (“Quando a cabeça está nessa confusão / Estás sem saber que hás-de fazer e ingeres tudo o que te vem à mão / O corpo é que fica / Fica a cair sem resistir"). Em 1982!
O mesmo álbum também traz É P'ra Amanhã:

Mais uma que ainda vale para hoje, fala de como a gente continua vivendo sem fazer o que realmente queremos: “Foi mais um dia e tu nada viveste / Deixas passar os dias sempre iguais / Quando pensares no tempo que perdeste / Então tu queres mas é tarde demais".

Depois, António lança Dar & Receber em 1984. Também adoro. Tem, por exemplo, a Canção de Engate:

Tu que buscas companhia
E eu que busco quem quiser
Ser o fim desta energia
Ser um corpo de prazer
Ser o fim de mais um dia
"

Podia ser uma simples música de amor, mas a gente não consegue desassociar o próprio Variações da letra; então é lógico que a gente acaba lendo uma jogo de sedução entre ele e alguém que ainda pode estar em dúvida em relação à sua sexualidade.
É essa música que Filipe Catto gravou no seu álbum Catto (2017).

Fique com mais umas imagens de Variações pois nunca é demais:

ATUALIZAÇÕES 21/05/20, às 14h:
Bom, continuo viciado.
A novidade é que consegui assistir ao filme (tem alguns torrents suspeitos e também no YouTube, mas provavelmente vai cair a qualquer momento, subiram em abril).
O filme não é perfeito, mas é lindo, uma história cheia de sonho e afeto. Num contexto de pandemia, a trama também ganha outras camadas de leitura.
Resumindo: assistam. Procurem. Vale a pena.
(Obrigado para a Beatriz, que chegou nesse post e me mandou um e-mail, pelo incentivo! <3)

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