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Você lembra de "O Gênio do Crime"?

Uma das minhas maiores referências da infância, o livro O Gênio do Crime foi lançado em 1969. Não fazia parte da série Vagalume, que a gente amava, mas tinha mais ou menos a mesma pegada: era uma história com ação e mistério e trazia protagonistas crianças. Depois dessa edição acima, que eu acho que era da Brasiliense e é a que li, ele foi para a Global (acredito que entre as décadas de 1980 e 1990). Hoje a editora Global é a responsável pela série da Turma do Gordo – pois sim, existem 13 livros da Turma do Gordo e O Gênio do Crime é apenas o primeiro!

A história tem um apelo delicioso: trata-se de uma investigação feita por crianças sobre um falsificador de figurinhas do campeonato de futebol. A editora, que promete prêmios em troca do álbum completo, está em maus bocados porque não consegue atender a demanda de álbuns completos decorrentes da venda ilegal de figurinhas falsificadas. Então a turma, formada por Edmundo, Pituca, Berenice e Gordo, decidem ajudá-lo. Eles ainda têm como rival um detetive gringo, apelidado “O Invicto", que quer desvendar o caso primeiro.

É nesse livro que aparece o conceito de "perseguição do avesso”, inventado pelo Gordo, que estimulou muito a minha imaginação. Quando entendi o que queria dizer na época, me achei um gênio (não do crime, claro)! E cheguei a ler algumas outras obras da série, como Cascata de Cuspe (que eu lembro que chegava a ser meio experimental, se não estou enganado), Sangue Fresco e O Caneco de Prata.
Ai, ai, deu até saudade.

O autor, João Carlos Marinho, é apontado como referência na área só pela Turma do Gordo (ele chegou a lançar livros fora da série sem chegar ao sucesso de O Gênio do Crime e as sequências). Uma vez eu estava em férias e passeando por São Paulo. Decidi dar uma fuçada na FNAC de Pinheiros (por aí você já vê que faz um tempo, mas a FNAC já estava meio decadente). E, surpresa, ia rolar uma sessão de autógrafos com João Carlos Marinho! Provavelmente foi em 2015, no lançamento do O Fantasma da Alameda Santos, o último da série da Turma do Gordo. Fiquei NERVOSO, mas ao mesmo tempo estava sem dinheiro, a fila já estava grande e ele nem tinha começado a autografar. Então decidi desencanar depois de um tempo e fui embora me contentando em tê-lo visto.

Nunca mais tive essa oportunidade. João Carlos Marinho morreu em 2019, 50 anos depois do lançamento de O Gênio do Crime.

Mas em 1973, algo aconteceu. Chegava nos cinemas o longa O Detetive Bolacha Contra o Gênio do Crime!

Descobri isso porque fui conferir uma informação que dei no programa Sessão da Tarde do meu podcast sobre Os Goonies. Eu comparei o estereótipo do personagem Chunk, ou Gordo na tradução, com o Gordo da Turma do Gordo de Marinho – que é o mais legal, o que fica com a mocinha e tem as melhores ideias!

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Fiquei chocado porque nunca soube do filme baseado no livro antes! Pelo que entendi, João Carlos Marinho participou ativamente da produção.
Há 6 anos, o diretor Tito Teijido (que nunca mais dirigiu um longa) disponibilizou o filme no Vimeo. Junto, ele publicou o seguinte texto:
Este filme foi realizado em 1972, faz 40 anos! Era plena ditadura militar e quem pretendesse dizer sua verdade corria risco de vida. Liberdade não havia e a vida se apresentava medíocre, triste e chata. Por isso fiz este filme, para proclamar o direito e a liberdade de cada um a inventar sua própria vida. Encontrei isso no romance "O Gênio do Crime" de João Carlos Marinho, que até hoje traz essa mensagem para a garotada do Brasil todo.
Hoje este é um filme primitivo, feito sem dinheiro e por amor ao cinema e à vida. Era um Cinema de Guerrilha.


RT se você chorou (eu chorei).

Vou te dar alguns motivos para assisti-lo abaixo:
. O filme é muito bom, principalmente se considerarmos que a produção foi pobre. É bem feito, um roteiro redondo, o som é audível (tem filme nacional antigo que você não entende nada, né?). Tem bastante cena externa, mostrando uma São Paulo de outra época e uma infância que era mais solta, que tinha a liberdade de brincar pela rua sem medo.
. Todos os atores são bons mas a menina que interpreta Berenice, em especial, ganhou meu coração demais. E o Gordo também é muito foda, inclusive como Afonsinho! O ator se chama Arlindo Paulino, mas acho que nunca fez mais nada no cinema.
. Outros atores: acho que Fernando Uzeda é o Edmundo e, pela lógica, Pituca seria Antonio Claudio. Cristiane Heuer é a Berenice? Não tenho certeza. Cazarré deve ser o dono da editora (ele era um ator incrível e morreu atingido por bala perdida em 1992). Osvaldo Tesser, argentino, faz o detetive John Smith Peter Tony. Ele também morreu em 2019. Sidnei Paiva Lopes é o assistente dele – um cara bem envolvido com cinema, chegou a codirigir a comédia Sabendo Usar Não Vai Faltar em 1976.
. Quando o Gordo tem uma ideia genial, ele fica fazendo toda uma cena. Isso já existia no livro e é muito divertido ver como eles concretizaram essa "geração da ideia” no longa! <3
. O xingamento “cara de jaca” é tudo para mim.
. O pôster do Snoopy: quero.
. A calça listrada com blusa vermelha do Edmundo na cena da perseguição: também quero esse look.
. E as cenas do jornal na TV? Todas maravilhosas!
. Corintianos vão ter um apreço bem especial por esse filme. E quem gosta de futebol no geral também!

Quem quiser assistir pode ir nesse link – a senha é sanlo46
E quem quiser ler uma entrevista exclusiva que fiz com o diretor do filme, vem nesse link!

Arlindo Paulino, que fez o Gordo no cinema, no centro; ao redor, pessoas da equipe do filme. Acho que o Teijido é o de preto com o braço apoiado na cadeira do Paulino

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