Wakabara

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Dor, glória e me, myself and my mother

O filme novo do Pedro Almodóvar faz sentido se a gente pensar nos nossos tempos individualistas, nos quais só se vê selfie e opiniões pessoais nas redes sociais (aliás, só se vê mas quem lê? É para se pensar). Em Cannes Dor e Glória acabou deixado de lado; privilegiaram filmes com fundo mais político. No festival francês quem lacra lucra - os prêmios, ao menos. Mas achei Dor e Glória bem interessante: essa revisão de si mesmo, a releitura mais aprofundada que chega à medida que a idade passa, o autoconhecimento.

Momento bom para avisar que sim, vai ter spoiler nesse texto. Se você não quiser spoiler, melhor assistir ao filme antes e depois voltar aqui, sim?

Alerta: SPOILER

Estás avisado.

Acho que Almodóvar morre de medo de ser apontado como um cineasta que se repete (e ele brinca com isso nesse longa, com o cineasta Salvador Mallo interpretado por Antonio Banderas falando que se repetiu durante a carreira). Ao mesmo tempo é corajoso e atrevido: consegue mostrar a mesma coisa de filmes anteriores só que de tantos jeitos e com tantos combinações, é um choque. O bloqueio criativo; o ambiente hospitalar; o ambiente doméstico (e especialmente a cozinha); a relação com a mãe; a infância com padres; o vilarejo em contraste com a cidade grande; o encantamento com o corpo nu; o espaço do teatro com plateia; o uso de aditivos; o backstage (a câmera de filmagem, a coxia); a piscina. E deve ter mais um monte de coisa que aparece de novo aqui, “igual mas diferente".

O que se acrescenta, principalmente, são as dores do personagem principal Salvador, a velhice e com isso o corpo não respondendo mais como antigamente. Essa questão de idade já foi retratada antes por Almodóvar mas, que eu me lembre, nunca como tema tão central e de detrimento físico.
Achei um pouco bobo a metáfora do engasgo que, depois da cirurgia, desbloqueia Salvador criativamente. Mas é um bobo que funciona, e realmente acredito que o corpo fala então isso me toca.

Já a referência constante à relação de Salvador com a mãe é tensa e verdadeira. Pedir desculpa por ter se tornado algo que decepciona, por mais que isso fuja ao seu controle, é pesadíssimo, né? Ter a consciência da situação como um todo e mesmo assim pedir desculpa… vixe. Acho que não conseguiria assumir essa posição tão nobre e com tanta humildade, eu hein.

Mas acima de tudo a questão da autoanálise e de revisão aprofundada me parece algo de que estamos precisados. Como chegamos aqui? E como a narrativa se construiu para chegarmos aqui?
Gostei do filme - mas talvez porque estou ficando velho. Não sei se gostaria dele nos meus 25 anos! Risos!

Aproveito o momentinho para fazer uma lista do meu best of de Almodóvar. Ele se baseia mais em gosto pessoal do que em qualidade cinematográfica. Chega mais:

É muito injusto fazer listas - deixei filmes que amo demais de fora, como De Salto Alto com a maravilhosa Victoria Abril toda montada de Chanel querendo competir com a mãe Marisa Paredes; o tocante Volver que é meio história de fantasma meio empoderamento feminino; A Lei do Desejo e sua sexualidade que enlouquece; a comunicação entre homens e mulheres em Fale com Ela
Olha, na dúvida, assiste todos, tá?

ATUALIZAÇÃO 25/08/2019: Já faz um tempo que queria incluir esse podcast produzido pelo Nexo para complementar o post, porque achei bem interessante!

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ATUALIZAÇÃO 19/09/2019: Agora saiu essa entrevista com Antonio Banderas no Vulture, na qual ele relembra sua carreira desde Labirinto das Paixões! Achei mara!